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Cannes abraça a América em 2024

Tendência de festivais europeus se renderem a Hollywood se intensifica com seleção da 77ª edição de Cannes, que acontece entre 14 e 25 de maio

Reinaldo Glioche

O grande destaque da lista de Cannes em 2024, divulgada na manhã desta quinta-feira (11), é o predomínio absoluto de produções em língua inglesa tanto nas mostras competitivas como em exibições fora de competição. 10 dos 19 filmes que concorrem à Palma de Ouro são falados no idioma e duas produções chamam a atenção por serem essencialmente americanas e sobre a América: “Megalopolis”, de Francis Ford Coppola, e “Horizon: An American Saga, de Kevin Costner.

Cena de “The Apprentice” | Foto: Divulgação

Tudo leva a crer que será uma edição para lá de pop do festival. Nova parceria entre Yorgos Lanthimos e Emma Stone (“Kinds of Kindness”) e Sebastian Stan como Donald Trump (“The Apprentice”) são apenas duas amostras dessa tendência. Mas há, ainda, um filme estrelado por Selena Gomez e Greta Gerwig na presidência do júri.

Há espaço, claro, para o cinema autoral, mas mesmo ele parece adornado pela língua inglesa. O já citado “The Apprentice”, que vai discutir a figura de Trump em ano que ele desponta como favorito à eleição presidencial nos EUA, é dirigido pelo iraniano Ali Abbasi. O francês Jacques Audiard apresenta, também em inglês, “Emilia Perez”, também falado em espanhol. Não em virtude disso, mas também por essa formatação, trata-se de uma seleção menos empolgante do que a expectativa orientava.

A última loucura de Coppola

Após uma corte febril de Francis Coppola entre os organizadores dos festivais de Cannes, Veneza e Toronto, “Megalopolis” garantiu uma vaga de estreia de gala no Palais na sexta-feira, 17 de maio pela competição oficial. O advogado de longa data de Coppola, Barry Hirsch, ainda está em negociações para garantir um parceiro de distribuição para um filme que alcançará o público no outono, com ênfase em cinemas Imax.Os estúdios, porém, estão reticentes em embarcar na empreitada. Cannes pode mudar tudo – ou sepultar as chances do filme.

Não é difícil entender por que o diretor tem um carinho por Cannes. Coppola estava em apuros de verdade quando fez “Apocalypse Now”. Naquela época, havia muitos cínicos propagando rumores de que o filme estava fora de controle e acabaria com sua carreira. Ele o trouxe para Cannes como um trabalho em andamento, e ele conquistou a Palma de Ouro, encontrou sua distribuição e se tornou um filme seminal na história do cinema. Poderá a história se repetir?

O novo filme de Coppola está cheio de ideias que fundem o passado com o futuro, com uma fábula épica e altamente visual que se encaixa perfeitamente em uma tela Imax. Um acidente causa a destruição de uma metrópole semelhante a Nova York que já está se decompondo, trazendo visões opostas do futuro. De um lado está um idealista arquitetônico ambicioso, Cesar (Adam Driver). Do outro está seu inimigo, o prefeito da cidade Frank Cicero (Giancarlo Esposito). O debate se torna sobre abraçar o futuro e construir uma utopia com materiais renováveis, ou adotar uma estratégia de reconstrução como de costume, repleta de concreto, corrupção e negociações de poder às custas de uma classe subjugada. No meio desse embate está a socialite filha do prefeito, Julia (Nathalie Emmanuel), uma jovem inquieta que cresceu cercada de poder e se cansou de ser uma figura de tabloide.

Brasil em Cannes

O cineasta brasileiro Karim Aïnouz garantiu pela segunda vez consecutiva sua presença na competição oficial. Em 2024, o diretor apresentará “Motel Destino”, um longa-metragem inteiramente filmado no Ceará, seu estado natal, enquanto no ano anterior participou com “Firebrand”, seu primeiro projeto em língua inglesa, que será lançado comercialmente ainda este ano pela Paris Filmes.

“Motel Destino” marca a sexta passagem de Aïnouz pelo evento, um recorde no cinema nacional, e traz como protagonistas Iago Xavier, Nataly Rocha e Fabio Assunção.

“É sempre muito emocionante ter um filme selecionado para o Festival de Cannes. Embora seja a minha sexta vez aqui, parece a primeira. Foi lá que estreei com ‘Madame Satã’, há mais de 20 anos, exibi na Quinzena dos Realizadores ‘Abismo Prateado’ e fui premiado com ‘A Vida Invisível’ na mostra Un Certain Regard. Foi no festival que dividi com o grande público ‘Marinheiro das Montanhas’, um filme tão pessoal sobre a história dos meus pais, e também ‘Firebrand'”, celebra o diretor.

Cena de “Motel Destino” | Foto: Divulgação

O erotismo, um elemento recorrente na filmografia de Karim Aïnouz, é o centro deste oitavo longa de ficção. Ele direcionou suas lentes para as cores intensas e vibrantes do litoral nordestino, que definem a estética e narrativa do novo trabalho.

 “’Motel Destino’ é um filme insaciável, sedento e sensual. Nesse retorno, me dei o prazer de explorar novas possibilidades estéticas e dramatúrgicas. Sob o sol implacável do Ceará, ousei sonhar um filme novo, com muito suor, tesão, alegria e a vitalidade própria de quem tem fome de existir”, diz o diretor.

O estabelecimento de beira de estrada que dá título ao novo filme é, segundo Karim, “o principal personagem do enredo e o local onde se entrecruzam questões crônicas da realidade brasileira”. O longa é um retrato íntimo de uma juventude cujo futuro foi prejudicado por uma elite tóxica e esmagadora, contra a qual a insubordinação e a revolta muitas vezes são as únicas saídas possíveis.

“Me interessa muito falar de desejo e revolta, temas de absoluta relevância no Brasil contemporâneo. ‘Motel’ é uma saga do encontro de um rapaz em fuga, totalmente vulnerável, com uma mulher aprisionada pelas dinâmicas de um casamento abusivo. Unidos pelo destino, seus caminhos se cruzam e a história se desenrola”, resume Aïnouz.

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