Redação Culturize-se
A edição de 2023 do Prêmio Jabuti, a mais prestigiada premiação literária do Brasil, já está marcada por uma polêmica envolvendo o livro “Frankenstein”, cujas ilustrações foram geradas por inteligência artificial (IA). A Câmara Brasileira do Livro (CBL), responsável pela organização do prêmio, retirou a obra da lista de semifinalistas na categoria ilustração, conforme anunciado em 10 de novembro.
A divulgação inicial das obras indicadas ocorreu em 9 de novembro, e “Frankenstein”, assinado pelo designer Vicente Pessôa e publicado pela editora Clube de Literatura Clássica, figurava entre os 10 selecionados na categoria ilustração. O livro ganhou destaque ao ser lançado em 2022, promovido como a primeira vez, não apenas no Brasil, mas globalmente, que um clássico foi totalmente ilustrado por inteligência artificial.
A CBL justificou sua decisão, afirmando que “as regras da premiação estabelecem que casos não previstos no regulamento sejam deliberados pela curadoria, e a avaliação de obras que utilizam IA em sua produção não estava contemplada nessas regras”.
Em resposta à desclassificação, Vicente Pessôa argumentou que a história já testemunhou polêmicas semelhantes, mencionando a invenção da fotografia e do cinema. Ele afirmou: “As pessoas sempre têm medo das coisas novas. A gente fez uma coisa nova, e, agora, estamos sendo punidos por isso”.
Lu Magalhães, presidente da Primavera Editorial, escreveu artigo aprofundando essa percepção. “O ponto que defendo é que a produção da arte – em rigor, disruptiva – não pode ser contida ou restrita a um tipo de instrumento. Da pena à tecnologia, a produção artística evolui, espelhando a ferramenta disponível para criar. Óbvio que temos que pensar na criação de mecanismos para proteção dos direitos autorais, mas não acredito que o caminho seja proibir ou ignorar um movimento tecnológico em prol da inovação de vários mercados, incluindo o editorial. Os limites éticos e jurídicos precisam estar à altura de um debate mais profundo e contemporâneo”
O cartunista André Dahmer, um dos jurados do prêmio, utilizou as redes sociais para expressar sua surpresa, afirmando não saber que as ilustrações haviam sido feitas por IA. Mesmo com a informação do nome “Midjourney” (software de IA) associado a Pessoa, o jurado alegou não estar familiarizado com esses softwares.
Diante da controvérsia, a CBL anunciou que “a utilização dessas novas ferramentas será objeto de discussão para as próximas edições da premiação”. A polêmica ressalta os desafios e questionamentos éticos que envolvem a integração de tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, no cenário das artes e da literatura.
“Criar uma ilustração via inteligência artificial é algo tão sofisticado e artístico quanto desenhar com uma pena”, observa Lu Magalhães. “Essa interação máquina e artista requer um talento fino, ditado majoritariamente pela mente humana. Temos que avançar e qualificar esse diálogo”.