Search
Close this search box.

VAI TER BAIXA CULTURA SIM!

Edson Aran

Gostar de alta cultura é fácil. Basta falar de Jazz, Borges e Nouvelle Vague para ser bem recebido em qualquer rodinha. Difícil mesmo é demonstrar apreço pela baixa cultura, que não dá prestígio e nem impressiona. Mas eu ensino como.

Autoajuda

Como ler autoajuda sem sentir culpa. Primeiro, o gênero pode tranquilamente se disfarçar de filosofia, o que é ótimo para angariar simpatia. Especialmente quando a coisa é praticada pelo Mário Sérgio Cortella-a-a. E ele está ce-e-erto-o, pois tudo, afinal, é autoajuda, incluindo a religião e a ideologia-a-a. O maior autor do segmento é o alemão Karl Marx, cujos aforismos poderiam ser perfeitamente reunidos num livrinho chamado “Como o comunismo pode mudar sua vida”.

Você acha que é deboche, né? Então decida o que é consciência social e o que é consciência pessoal nas seis frases que seguem:

  1. Trabalhe para uma causa, não por aplausos.
  2. Eu não sou o que aconteceu comigo, eu sou o que decidi me tornar.
  3. Eu sou forte porque fui fraco, não tenho medo porque tive medo.
  4. Acorde com determinação, vá para a cama com satisfação.
  5. Cerque-se de pessoas que te fazem feliz. Pessoas que te fazem rir, que te ajudam quando você está precisando. Pessoas que realmente se importam.
  6. Eu não sou nada, mas devo ser tudo.

Lembre-se: sem uma atitude positiva, não se consegue nem pegar um über, quanto mais liderar uma revolução socialista.

Sertanejo

É um gênero musical muito mais rebelde que o rock’n’roll. Olha só: antigamente, no reino do patriarcado, todos os cantores eram cornos conformados. Agora, sob o #MeToo e o Novo Feminismo, todos viraram pegadores inveterados. Não dá pra ser mais subversivo do que isso.

As rimas são simples, mas trazem verdades profundas: “Roça, roça em mim, roça, roça em mim, tiro o chapéu e a bota e te boto gostosim, te boto, te boto, galopando gostosim”.  (Luan Pereira, Ana Castela e Zé Felipe, “Roça em Mim”) No sertanejo é aceitável laçar mulheres na Festa do Peão e desfilar na porta do quartel com uma bandeira amarrada no pescoço. Afinal, quando se escuta essas belas canções, você é magicamente transportado a um tempo que não existe mais: a vida boa na roça, o pé atolado na bosta e a morte por esquistossomose antes dos 40 anos.

Standup

É impossível comentar o humor brasileiro contemporâneo sem mencionar o standup, embora seja possível comentar o standup brasileiro contemporâneo sem mencionar o humor.

Mas isso é coisa de gente invejosinha que não consegue monetizar a gracinha.

Se você não quer virar crente, o standup é a coisa mais parecida com um culto que você pode assistir, com exceção, é claro, de uma palestra do Cortella-a-a. A diferença é que ninguém vai passar a sacolinha para recolher doação.

O standup também é uma ótima oportunidade para ver um homem adulto reclamando da mãe. Melhor do que isso, só se você for psicanalista e o cara pagar para reclamar da mãe.

O standup se alicerça em observações sobre a banalidade do quotidiano, como se o comediante fosse comentarista de pesquisa eleitoral. Mas a maior contribuição do gênero é revelar como é a vida dos pobres. 90% do standup é sobre isso e o 10% que sobra é elitista e não merece atenção. O problema é que de tanto falar em pobreza, o comediante enriquece, compra um jatinho, perde autenticidade e aí o show fica pobre, pobre. 

(Resposta para o teste da autoajuda. Consciência Social: 2,5,6. Consciência Pessoal: 1,3,4)

Deixe um comentário

Posts Recentes