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Ben Stiller e a nostalgia por “Trovão Tropical”

Reinaldo Glioche

O filme “Trovão Tropical” (2008), de Ben Stiller, é uma comédia de ação satírica que continua sendo um marco nos debates sobre a evolução da comédia e as normas sociais nos meios de comunicação. Coescrito por Stiller, Etan Cohen e Justin Theroux, o filme acompanha um grupo de atores egoístas filmando um filme de guerra, que acaba sendo lançado involuntariamente em um conflito real na selva. Com estrelas como Robert Downey Jr., Jack Black, Tom Cruise e Matthew McConaughey, o filme foi um projeto ambicioso que simultaneamente parodiou e criticou algumas das práticas mais controversas de Hollywood, incluindo o branqueamento (whitewashing) e a atuação extrema no método de  Lee Strasberg.

Stiller e Downey Jr. em cena de “Trovão Tropical” | Foto: Divulgação

Apesar do sucesso comercial, arrecadando US$ 195 milhões mundialmente contra um orçamento de US$ 92 milhões, “Trovão Tropical” enfrentou críticas substanciais, mesmo após seu lançamento. A interpretação de Downey Jr. como Kirk Lazarus — um ator que se submete a uma cirurgia experimental para pigmentação para interpretar um soldado negro — gerou debates acalorados. O personagem foi pensado como uma crítica às tentativas desesperadas dos atores de ganhar prêmios por meio de medidas extremas, mas utilizou o blackface, uma prática carregada de racismo, como parte da sátira. O filme também incluiu o personagem parodiado Simple Jack, interpretado por Stiller, que foi criticado pela forma como retratou a deficiência intelectual. Ambos os elementos foram posteriormente destacados como exemplos de comédia ousada que pode ter ultrapassado o limite e se tornado ofensiva.

Refletindo em entrevista recente ao Collider sobre o legado do filme, Stiller reconhece que o humor de “Trovão Tropical” provavelmente impediria sua produção no clima cultural de hoje. Ele descreveu o filme como “incrivelmente arriscado”, admitindo que, mesmo em 2008, sua realização exigiu substancial apoio da indústria por figuras como Steven Spielberg e o estúdio DreamWorks, então em ascensão. Stiller se mantém firme em defender a intenção do filme, enfatizando que as piadas visavam as falhas de Hollywood, e não as comunidades retratadas. No entanto, ele admite que não assumiria os mesmos riscos criativos no cenário cultural mais sensível atual.

Stiller não é o primeiro – e provavelmente não será o último – comediante a criticar o cerceamento da comédia pelo vigente establishment cultural. Jerry Seinfield, para citar um titã do humor americano, fez críticas ainda mais duras – e depois se retratou – ao que chamou de “morte da comédia pelo movimento woke”.

A mudança nas expectativas do público e no ambiente mais amplo da mídia tornou comédias ousadas como “Trovão Tropical” cada vez mais raras. Os cineastas modernos estão mais atentos ao potencial dano causado ao reforçar estereótipos ou trivializar assuntos sensíveis. Enquanto alguns veem essa evolução como uma limitação da expressão criativa, outros a consideram um passo necessário em direção a uma narrativa mais inclusiva. Como Stiller mesmo observou, “não é uma piada se vai te fazer rir e a outra pessoa chorar”, sublinhando a importância de equilibrar o humor com empatia.

O legado de “Trovão Tropical”, no entanto, reflete uma mudança cultural mais ampla. Em 2008, comédias com classificação R como “Quase Irmãos” e “Segurando as Pontas” estavam em alta, mas os anos subsequentes viram o gênero perder parte de seu apelo mainstream à medida que os padrões sociais evoluíram. O filme de Stiller continua sendo um estudo de caso fascinante, ilustrando tanto os riscos quanto as recompensas da sátira provocativa. Ele desafia o público a considerar a linha entre criticar práticas prejudiciais e perpetuar o mal, e quais responsabilidades os cineastas têm ao abordar tópicos complexos como racismo e capacitismo.

À medida que a sociedade muda, também mudam os limites do que é aceitável — e é essa dinâmica evolutiva que mantém viva a conversa sobre mídia, humor e representação.

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