Tom Leão
Nunca fui fã de musicais. Esse lance de, de repente, uma pessoa começar a falar cantando e sair saltitando, eu achava muito estranho, quando via, ainda guri, na ‘Sessão da Tarde’, aqueles antigos musicais da Metro, super coloridos (os filmes do Elvis, eram ok). O primeiro musical que vi e gostei, de fato, foi o maravilhoso ‘Cantando na Chuva’ (‘Singin´ in the rain’), que peguei numa exibição especial em cinema, por ocasião de aniversário do filme. Na sala, só eu e um casal. Pena. É simplesmente o melhor musical do cinema, de certa forma, emulado no recente ‘Babilônia’ (que, um dia, terá o seu valor reconhecido).
Claro que, na adolescência, abri exceção para as ópera-rock. Como ficar indiferente a ‘Tommy’ (o alucinado filme de Ken Russel, baseado na obra do The Who)? E ao eletrizante ‘Fantasma do Paraíso’, versão moderna do ‘Fausto’, de Goethe, e um dos melhores e menos conhecidos da filmografia do Brian De Palma? Procurem ver. No caso de ‘Tommy’, nenhuma encenação que vi, suplanta o filme.
Contudo, em teatro, então, era mais difícil de encarar. Adentrei neste mundo mais por causa de minha mulher e de meu filho, que curtem peças musicais. Começou com ‘A Noviça Rebelde’, ainda em DVD, e fomos, aos poucos, explorando este e outros nos palcos, graças a qualidade das produções da dupla Moeller & Botelho, que, além de ‘The Sound of Music’ (o nome original da ‘Noviça’), encenaram também ‘Hair’ e ‘Avenida Q’, entre outros.
Mesmo assim, sempre procurei atrelar a ida a algum musical em teatro (sobretudo na Broadway, onde o ingresso custa uma baba) a algo que tivesse conexão com meus gostos musicais e culturais. Tipo Monty Python. Foi assim, que vi a peça deles (já fora de cartaz), ‘Spamalot’, que adaptava, de modo bem bizarro, a trama básica do primeiro e mais cultuado filme da trupe inglesa, ‘Monty Python & O Cálice Sagrado’. Também foi por causa de um filme musical que cheguei até a peça ‘Hedwig’ (que, por sua vez, nasceu de uma peça off-Broadway de mesmo nome), do John Cameron Mitchell. Dá para dizer que, embora a peça seja bem empolgante (uma banda de rock toca ao vivo, em altos decibéis), ainda achei o filme melhor.
Todo esse preambulo foi só para dizer que, nas minhas últimas férias, dei uma passada por Nova York — onde não ia desde antes da pandemia –, e acabei vendo ‘Back to the Future, the Musical’. Sim! A adaptação para os palcos do mega cultuado e super bacana filme de viagem no tempo do Robert Zemeckis, que já disse que, enquanto ele estiver vivo, não rola remake, ninguém mete a mão.
E, vendo a peça musical, com libreto do próprio Zemeckis com Bob Gale (os roteiristas originais), percebemos porque rolou essa ‘exceção’. Simplesmente é uma tradução mega fiel do filme, com pequenos adendos. O filme dura duas horas, e a peça, duas horas e meia. Então, o que muda, sobretudo, são alguns números musicais (ao total, são 26) que criam cenas extras, que não existem no filme, mas dentro do contexto. Tipo: um solo do pai do McFly, por exemplo. Aliás, o ator que faz o pai (Hugh Coles), é simplesmente espetacular em seus trejeitos.
É claro que a dupla Doc e Marty McFly (emulados na série animada ‘Rick & Morty’), feita por Roger Bart (que também fez o papel na montagem inglesa) e Casey Likes (que faz Gene Simmons, do Kiss, no filme ‘Spinning Gold’, já comentado nesta coluna), é fora de série. O Doc Brown do teatro é tão bom, que o nome do ator é o primeiro do elenco. Só vendo para entender. O personagem ficou muito mais sacana, faz muitos trocadilhos (tantos que, dá a impressão de que o ator improvisa bastante, sempre fazendo o que interpreta McFly rir, sem querer, em cena) e, por pouco, não ofusca a interpretação maravilhosa de Christopher Lloyd, nos filmes.
Mas, o que impressiona mesmo, são os efeitos especiais para os momentos em que o DeLorean precisa ir de 1985 para o passado (1955); e, sobretudo, na cena final (Doc pendurado no relógio da prefeitura e Marty pegando embalo para voltar ao futuro). O que acontece no palco é algo simplesmente mágico. Uma mistura de vídeo, luzes, efeitos especiais práticos, enfim, magia pura. O carro realmente flutua e dá aquela volta no ar, antes de partir na fumaça! Só de lembrar, fico arrepiado. Veria de novo, numa boa. Então, fica a dica: se você, como eu, não é muito fã do gênero, ‘Back to the Future, the Musical’ é algo bem além da curva. Você nunca mais vai dizer que musical da Broadway é cafona.