Em outubro aconteceu a 5° edição da Vegan Fashion Week, em Los Angeles, mas no Brasil a moda vegana já é realidade com marcas que já estão no mercado há mais de 20 anos.
Por Mayra Couto
A moda vegana começou a despontar no mercado já há muitos anos, uma das primeiras marcas a surgir no Brasil foi em 2001. Hoje grandes designers e marcas já olham para o segmento, a Vegan Fashion Week chegou à sua 5° edição em Los Angeles, no início de outubro. Mas como são os parâmetros da indústria para a moda vegana, como está essa vertente no Brasil e quais as perspectivas?
O segmento da moda vegana e, inclusive, o Vegan Fashion Week tem como princípio evitar a crueldade animal e promover uma moda mais sustentável. Objetivos reforçados pela atriz Mychal-Bella Bowman, na última edição do evento: “A Vegan Fashion Week vai além de apenas uma tendência. É um farol de transformação, guiando-nos em direção a um futuro da moda onde a humanidade e os animais coexistem em compaixão e harmonia. O nosso futuro é construído a partir das nossas ações de hoje. As nossas escolhas, os designs que usamos, a cultura da moda que cultivamos, tudo ressoa fortemente sobre o mundo que desejamos”.
No Brasil, uma das primeiras marcas veganas criadas foi a paulista King55 utilizada por nomes como o ator Taumaturgo Ferreira, Rogério Flausino do Jota Quest e Branco do Titãs.
A marca nasceu em 2001 e veio de uma condição inspiradora dos filhos do fundador e diretor criativo Amauri Manhaes Caliman: “A King surgiu com o intuito de eu passar a minha experiência em confecção para os meus filhos. E minha filha falou: `pai, tem que ser uma marca vegana`. A gente já tinha uma vida vegana em casa. Ou seja, eu queria passar minha experiência e eles me colocaram a condição de ser uma marca vegana, que não maltrata os animais. A King foi muito pioneira. Naquela época, a questão da alimentação, por exemplo, era bem complicada. Não tinha muitas opções no mercado. Logo em seguida, meu filho também virou vegano. Eu não sou vegano, mas não como carne. Com dois filhos veganos, como vou comprar o filet mignon pra casa?”, conta.
Modelos de sucesso
Ser pioneiro, geralmente, não é fácil e na hora o Amauri resolveu topar o desafio dos filhos: “Quando eu falei sim, eu pensei, é meio fácil fazer vestuário, camiseta, calça jeans, é algodão ou elastano, esses itens já não carregam traços animal. Para o vestuário, não era tão difícil. Mas eu falava para os meus filhos: `Não basta ser vegano, tem que ter estilo, personalização, qualidade e precisa ser bonito para que as pessoas comprem`. Fomos maturando isso com o tempo. E o desafio maior começou com os acessórios, cintos, bolsas, produzir algo que encantasse as pessoas, longe da matéria prima do couro”, explica.
A King55 é uma marca totalmente vegana e as preocupações vão além da matéria prima sem crueldade animal, envolve cadeia de produção e, inclusive remuneração do trabalho: “A King, além de ser vegana, tem preocupação com a cadeia de produção e a mão de obra. Muita gente nessa indústria ainda ganha uma merreca para produzir muitas horas por dia. Para ser algo vendido tão barato, alguém está pagando com sangue. A gente não quer mão de obra escrava. Por isso, todos os nossos produtos sabemos exatamente quem está produzindo, sabemos de onde está vindo nossa matéria prima. Não fazemos roupa barata porque quando é barato demais, alguém está perdendo, alguém está pagando por isso. A cadeia produtiva, tem que ser correta”, comenta Amauri.
A moda vegana também chama atenção para a sustentabilidade na moda e levanta questionamentos sobre uma linha de produção ostensiva e que produz muito lixo a longo prazo. “Muitas marcas lançam coleção a cada 6 meses e é um absurdo a quantidade de lixo que são geradas. Porque tudo aquilo que comprei já não é legal? O Fast Fashion gera muito lixo e coisas perecíveis que vão aparecer depois em algum lugar. O consumo consciente também é uma coisa que nos preocupamos”, conta.
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Para incentivar esse consumo consciente, a King55 tem algumas ações que promovem esse consumo, inclusive o second hand, que já vem sendo bem aceito pelo brasileiro. Os clientes podem levar na loja seu jeans usado, que a marca chama de ex-jeans, não importa o estado dele e o cliente ganha automaticamente 30% de desconto na compra do próximo jeans. Além disso, no site da King55 tem uma aba intitulada Custom, nela só tem peças que já foram utilizadas e agora ganham uma nova identidade personalizada pelo próprio diretor criativo da marca, o Amauri Manhaes Caliman.
Outra marca brasileira atenta à moda vegana, mais jovem, a Alme, tem 5 anos de mercado e hoje integra o ecossistema do grupo Arezzo, fez uma evolução de mercado há 2 anos e criou uma linha vegana. “Sempre fomos uma marca atenta aos comportamentos. Antes da pandemia já víamos um movimento vegano, mas era algo mais nichado. Na pandemia, nós repensamos muito nosso negócio. Sempre pensamos em conforto e bem estar no calçado. Naquela época, o couro ainda era uma matéria prima muito cobiçada. Mas optamos por fazer uma evolução para um conforto onde a gente não olha só para o indivíduo, e sim para o ecossistema como um todo. Então, construímos uma marca que olha para as matérias primas, o meio ambiente, na busca de um calçado que tivesse um menor impacto possível”, explica Isabella Barbieri, head da Alme.
Hoje o principal produto da marca, que possui selo vegano, é a sandália Slide. “Elas são feitas com EVA verde, que foi desenvolvido no Brasil e é uma evolução, tem como origem a cana de açúcar. Além disso, conta com pó de pneu, parte de fivelas e plástico reciclado, na sua composição. Todo o processo de fabricação é editado pela SVB, temos que ter certeza que a esteira não tenha nada de resquício animal. Além da sandália, tem outros produtos da Alme que não tem nada de origem animal”, conta Isabella.
A empresa que acompanha o processo para ter certeza que o produto é vegano é a Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), uma das principais instituições que podem certificar esse selo hoje no Brasil, inclusive para produtos alimentícios e cosméticos.
Assim como outras marcas com linhas veganas, a Alme tem uma preocupação maior em relação ao ecossistema, a cadeia de produção e seu impacto. “Estamos caminhando para nos tornar uma marca mais consciente, medimos pegada de carbono, olhamos para o processo e matéria prima. Entendemos o impacto do produto e compensamos. Hoje um tênis de couro tem um impacto de 5kg de pegada de carbono, depende do modelo. O nosso tem um impacto quase três vezes menor. Porque temos matéria prima, processo e até embalagem diferenciada, não usamos plástico. A marca fez essa evolução para que ela fosse ao todo mais sustentável. Qualquer negócio gera um impacto e nosso propósito é reduzir ao máximo”, comenta.
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Outro ponto também levantado é olhar para o fim da vida do produto: “Mais do que veganismo, temos que falar também sobre a origem de matérias primas. Uma das coisas que olhamos hoje é o fim da vida do produto. Sou mergulhadora e eu já cansei de ver sapato e chinelo embaixo da água. Então, olho muito para essa responsabilidade das marcas e do cliente, que alternativas temos hoje se o produto tá parado na casa da pessoa? Estimular o second hand e como descartar melhor esse produto. Temos muito a preocupação desse ciclo na Alme”, conta.