Reinaldo Glioche
Destacar a qualidade de “Oppenheimer” enquanto obra cinematográfica pode parecer supérfluo nesta altura do campeonato – dois meses depois de sua estreia nos cinemas-, mas só parece, não é. O filme caminha para chegar a impressionante marca de US$ 1 bilhão, um feito extraordinário se considerarmos se tratar de um drama biográfico, sobre as circunstâncias da criação da bomba atômica, cuja ação se concentra nos diálogos e com quase três horas de duração.
A jornada do filme, do fôlego comercial ao entusiasmo que desperta na indústria, estão intrinsecamente relacionados ao fato de que “Oppenheimer” é cinema em sua concepção mais pura e eloquente. Como Culturize-se estabeleceu de pronto, um clássico que reclama propriedades atemporais.
Além de Christopher Nolan dominar a gramática cinematográfica com invejável singularidade – algo reconhecido por seus pares – ele dobra a aposta no cinema enquanto modelo de negócio. “Barbie”, que estreou no mesmo dia nos cinemas, já está disponível para consumo em casa via VoD, enquanto “Oppenheimer” só chegará no digital em meados de novembro, garantindo uma janela de 100 dias de exclusividade no cinema.
São elementos que adensam o protagonismo do filme no ano e lhe outorgam primazia na contemporaneidade. “O filme nos lembra o poder do cinema”, cravou o cineasta Denis Villeneuve, que admitiu que não esperava que o filme fosse fazer tanto dinheiro e que está muito feliz com a performance comercial do longa de Nolan.
“Há essa ideia de que, na mente de algumas pessoas, os filmes se tornaram conteúdo em vez de uma forma de arte. Eu odeio essa palavra, ‘conteúdo'”, observou o diretor de “Duna” e “Sicario”. “O fato de filmes como ‘Oppenheimer’ serem lançados na tela grande e se tornarem um evento traz de volta um destaque à ideia de que é uma forma de arte tremenda que precisa ser experimentada nos cinemas.”
“Quando você faz um filme, você espera que ele se conecte com uma audiência de alguma forma,” disse Emma Thomas, a produtora de longa data de Nolan e sua esposa, à Associated Press. “Mas, especialmente com um filme de três horas que trata de um assunto sério e é desafiador de muitas maneiras, esse tipo de sucesso está além das nossas expectativas mais selvagens.”
O cineasta Paul Thomas Anderson incrementa esse entusiasmo ao observar que o longa é “uma aula de cinema que ostenta a capacidade de transformar nosso olhar sobre o mundo”. Não é um elogio qualquer! O cineasta disse, ainda, que o sucesso de público e crítica de “Oppenheimer” é como “a natureza se curando” em meio à percepção do fim do cinema como conhecemos.
O impacto do longa pode ser melhor dimensionado com as manifestações de outros cineastas de prestígio, como Martin Scorsese, que considera o filme “magistral”. Já Spielberg classificou o filme como “essencial para nosso tempo”.
Não dá para dizer se o filme será o vencedor do próximo Oscar, mas difícil crer que não esteja concorrendo às principais estatuetas. Todavia, “Oppenheimer” já superou o Oscar. Seu legado já é suficientemente opulento e multifacetado, mas seu lastro pode – e deve – ser ainda mais vistoso.