Reinaldo Glioche
Em uma cena da ótima sátira “The Franchise”, série recém exibida pela HBO, um produtor de estúdio externa a preocupação de Martin Scorsese estar certo e de os filmes de super-heróis terem “matado o cinema”. “Nós percorremos os dados e o interesse nunca foi tão baixo”, diz o sujeito, um decalque de Kevin Feige, o todo-poderoso da Marvel Studios.
Corta para o ranking das dez maiores bilheterias de 2024 nos cinemas e, pela primeira vez na história, só há sequências. “Wicked”, que é uma adaptação da Broadway, pode se infiltrar ali até o fim do ano, mas a lástima já está cristalizada.
Confira abaixo o ranking:
1. “Divertida Mente 2” – US$ 1,698 bilhão
2. “Deadpool & Wolverine” – US$ 1,337 bilhão
3. “Meu Malvado Favorito 4” – US$ 968,2 milhões
4. “Duna: Parte Dois” – US$ 714,4 milhões
5. “Godzilla e Kong: O Novo Império” – US$ 571,7 milhões
6. “Kung Fu Panda 4” – US$ 547,6 milhões
7. “Os Fantasmas Ainda se Divertem: Beetlejuice Beetlejuice” – US$ 451,07 milhões
8. “Venom: A Última Rodada” – US$ 439,9 milhões
9. “Bad Boys: Até o Fim” – US$ 404,5 milhões
10. “Planeta dos Macacos: O Reinado” – US$ 397,3 milhões
Essa inglória estatística, é bem verdade, foi agravada pelo efeito cascata das greves que assolaram Hollywood em 2023 e que obrigaram os estúdios a redesenharem seus calendários de estreias, mas os filmes que atingiram as maiores bilheterias no ano já eram mesmo as principais apostas dos estúdios para fazê-lo. O que ratifica a percepção de uma Hollywood cada vez mais refratária ao risco – e por consequência à essência do cinema.
A fadiga do super-heróis existe, mas os estúdios parecem mais dispostos a contorná-la com sequências – inclusive de filmes de heróis – e anti-heróis! E vilões! – do que apostar em produções sem base de fãs consolidada. É uma assimetria inédita na escala de soft power do cinema norte-americano e que pode gerar digressões – tanto comerciais quanto culturais – de difícil antecipação neste momento.