Redação Culturize-se
O novo livro de Becca Rothfeld, “All Things Are Too Small: Essays in Praise of Excess” (Todas as Coisas São Pequenas Demais: Ensaios em Louvor ao Excesso), ainda sem previsão para lançamento no Brasil, desafia o ethos cultural predominante do minimalismo. Por meio de uma série de ensaios instigantes, Rothfeld critica os produtos culturais sanitizados e frequentemente estéreis que o minimalismo gera, defendendo, em vez disso, o maximalismo como uma alternativa mais rica e vibrante. Doutoranda em Filosofia por Harvard e crítica literária do The Washington Post, Rothfeld analisa como o alcance do minimalismo nos meios de comunicação, práticas de saúde mental e até em nossas vidas pessoais nos deixou “espiritualmente empobrecidos”.
O minimalismo, frequentemente associado à simplicidade e clareza, promete libertação do excesso e da desordem. Contudo, Rothfeld argumenta que essa estética e estrutura filosófica achatam a complexidade, resultando em produtos culturais desprovidos de profundidade e provocação. O maximalismo, com sua aceitação da opulência e da contradição, torna-se o antídoto proposto por ela para essa austeridade criativa.
A capa do livro apresenta um trecho de “O Jardim das Delícias Terrenas”, de Hieronymus Bosch, uma escolha feita pessoalmente por Rothfeld. A visão fantástica e caótica de Bosch se alinha perfeitamente com sua crítica à esterilidade cultural. Rothfeld admira como Bosch cria mundos repletos de exuberância, oferecendo uma visão do paraíso não como uma ordem serena, mas como uma vitalidade caótica. Para Rothfeld, essa escolha artística encapsula a tese central do livro: a riqueza da vida está em sua desordem e excesso.
Minimalismo cultural: uma paisagem achatada
Rothfeld traça a dominância do minimalismo na cultura contemporânea, encontrando sua influência na ficção concisa, na moda normcore e nas estéticas estéreis de cafés modernos. Na literatura, ela lamenta a diferença marcante entre as narrativas enxutas de hoje e a prosa intricada e opulenta de autores como Henry James. Para Rothfeld, as frases elaboradas e o estilo narrativo digressivo de James representam um maximalismo literário amplamente ausente atualmente.
O cinema também se torna um campo de batalha para essas ideologias estéticas. Rothfeld critica a esterilidade erótica de “Rivais”, mas elogia a sensualidade queer de “Love Lies Bleeding”. Em ambos os casos, ela analisa como o excesso – ou sua ausência – molda as experiências emocionais e sensoriais proporcionadas pela arte.
O fardo de gênero do minimalismo
Rothfeld identifica o minimalismo como especialmente opressor para as mulheres. Historicamente, elas têm sido pressionadas a reprimir seus apetites e reduzir sua presença, tanto fisicamente quanto metaforicamente. As estéticas minimalistas, segundo Rothfeld, refletem essas expectativas sociais, encorajando mulheres a apagarem traços de sua individualidade e desejo.
Ainda assim, Rothfeld enxerga as mulheres como defensoras do maximalismo em certos domínios, especialmente na beleza pessoal. Para ela, estilizar a vida como uma obra de arte pode ser libertador e opulento, mesmo que corra o risco de ser considerado superficial ou fútil. Em seu próximo livro, Rothfeld pretende explorar mais profundamente a relação entre beleza e autoconstrução.
Mindfulness: um simulacro de controle
Rothfeld critica o movimento de mindfulness por sua aparente defesa do minimalismo, argumentando que ele prioriza o esvaziamento da mente em detrimento do envolvimento ativo com o mundo. Embora ofereça consolo, especialmente para comunidades marginalizadas com pouca agência, frequentemente substitui a ação coletiva por um falso senso de controle pessoal.
Traçando paralelos entre as práticas de organização e o mindfulness, Rothfeld sugere que ambas promovem um senso artificial de ordem. A verdadeira libertação, segundo ela, não vem do isolamento em um ambiente impecável, mas da aceitação da vulnerabilidade e da conexão.
Maximalismo em relacionamentos e na arte
Para Rothfeld, o maximalismo vai além da estética e invade os relacionamentos interpessoais. Ela vê a conexão genuína como inerentemente excessiva, exigindo vulnerabilidade e disposição para ser transformado pelo outro. Essa filosofia ressoa em sua exploração de comunidades queer, da cultura drag e da inversão carnavalesca de normas sociais.
Rothfeld também percebe na literatura e na arte espaços onde hierarquias tradicionais podem se dissolver, criando mundos que desafiam e reimaginam a realidade. Ela cita obras como The Duke of Burgundy e The Night Porter como exemplos da capacidade da arte de explorar dinâmicas complexas de poder, desejo e igualdade.
Um ponto chave no argumento de Rothfeld é a distinção entre excesso significativo e consumismo prejudicial. Ela defende a gratuidade nas relações e na cultura, mas condena os custos ambientais e sociais do maximalismo consumista. Sua visão de excesso é de profundidade e riqueza, não de acumulação material.
Em seus ensaios, Rothfeld também enfatiza o papel do pensamento como uma atividade prazerosa e necessária. Ela critica práticas de mindfulness que descartam o pensamento como um fardo, celebrando, em vez disso, as recompensas filosóficas e emocionais de enfrentar ideias complexas.
Em última análise, “All Things Are Too Small” é um chamado para resistir às forças niveladoras do minimalismo. Seja por meio da literatura, da arte ou dos relacionamentos pessoais, Rothfeld defende um retorno aos valores maximalistas de profundidade, contradição e exuberância. Seu trabalho convida os leitores a reconsiderar o que perdemos ao priorizar a simplicidade em detrimento da riqueza e a abraçar a desordem que torna a vida verdadeiramente significativa.