Edson Aran
O ser humano, essa apoteose da criação, esse campeão da evolução, esse estandarte de ouro do iluminismo, o ser humano, eu dizia, gosta mesmo é de sangue.
Quanto mais, melhor.
Repare: toda vez que estoura uma guerra, você entra no “X”, a rede social anteriormente conhecida como Prince, e todo mundo está extremamente desolado e deprimido:
“Oh, a humanidade!
“Oh, o horror!
“Oh, a intolerância!”
“Oh, a insanidade!”
Va até a esquina, espere meia-hora e volte.
Passada a polidez, começa a sordidez.
“Tem que matar!”
“Tem que esfolar!”
“Tem que aniquilar!”
“Tem que tacar fogo!”
O conflito distante, incapaz de afetar nossa tranquilidade, é o ideal para que o pitaqueiro virtual adote o modo “full-barbarian”. Ele não precisa de contexto, conhecimento histórico ou noções básicas de geopolítica. Isso é para os fracos. Nós, os especialistas em assuntos aleatórios, só precisamos exigir mais explosão, confusão e destruição.
Tem jeito não.
Falei do “X”, mas a rede do Elon Musk é só um exemplo. Acontece a mesma coisa no Feici, Insta, Tik Tok, Telegram e Zap-zap. É só patrulhamento, cancelamento e espancamento, três coisas que andam juntas, feito jumentos. Não importa se o tema é Bis ou Israel, Kit Kat ou Palestina, o negócio é jogar gasolina.
Mas é claro que a guerra precisa ser midiática, dessas que aparecem imediatamente na GloboNews, BBC e CNN.
Conflitos no Congo, Etiópia ou Armênia não agregam.
Azerbaijão, Miamar e Haiti? Ninguém tá nem aí.
Iêmen, Síria e Tigré? Isso não dá pé.
Guerra boa tem que ser popular feito série da Disney ou reality show da Record. Afinal, se uma árvore cai na floresta e ninguém vê, como é que vão arrumar treta com você?
No entanto, para explodir nas redes enquanto gente explode de verdade, aí vai a dica fundamental: o importante é ostentar virtude e demonstrar indignação.
Tipo assim: “Você é uma pessoa cruel, desumana e sem empatia! Tem que ser decapitada, esquartejada e bombardeada! Você, a sua mãe e a sua tia!”