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Especuladores adensam potencial da arte como investimento

Historicamente relacionado ao colecionismo e ostentação, a arte passa a ser percebida como um ativo financeiro em um mercado em transformação

Por Mariana Bueno

Se antes o investimento em obras de arte era uma exclusividade de pessoas milionárias e geralmente com um perfil mais velho, que gostavam de colecionar quadros e outras peças, hoje o cenário aponta para uma nova tendência.

Embora ainda seja algo pouco acessível ao investidor comum, aplicar o dinheiro em arte vem atraindo cada vez mais interessados. Inclusive há muitas corretoras entrando nesse mercado, com especialistas que recomendam ativos – nesse caso, artistas ou obras específicas e até mesmo filmes independentes.

Segundo o Índice Mei Moses, que compara a força do mercado da arte com o de outros ativos, o investimento em arte pode ser mais lucrativo que em ações ou em títulos de renda fixa. Dados do Citibank apontaram também que os retornos dos investimentos em arte têm um retorno médio de 5,3% ao ano, o que é semelhante ao dos títulos.

imagem da obra "Rio Negro" de Hal Wildson
Fotos: Divulgação/ArtRio

Apesar disso, grande parte dos que optam por investir em arte, não consideram apenas a questão monetária, mas também o apreço pela obra em si. É que, ao contrário de outros tipos de investimentos, as obras de arte ficarão na casa do proprietário ou em algum outro espaço que costume frequentar, como parte da decoração. Por isso, é importante que seja não apenas uma peça de valor, mas uma peça que tenha a ver com o gosto de cada um.

Isso faz com que o perfil dos investidores da atualidade se assemelhe ao perfil clássico de investimento em arte, com colecionadores que desbravam mundo afora, com curadoria ou não, garimpando peças que estão em alta ou que acreditem ter futuro.

A principal diferença entre os colecionadores e os investidores da atualidade é que os primeiros faziam (ou ainda fazem) pelo prazer de ter uma obra bonita, como uma peça decorativa, sem necessariamente ter interesse em um lucro futuro, como é o caso de quem investe.

Como são os investimentos em arte

Em relação à ideia ainda presente de que o investimento em arte é possível apenas para um perfil específico de pessoas, o historiador da arte Lucas Xavier, que também é pesquisador da imagem e educador, explica que esse é um estereótipo que existe porque é explorado pelo próprio mercado para alimentar a ideia de que o bom gosto está atrelado ao refinamento. “Existem iniciativas de galerias que pensam sobre acessibilidade em relação ao colecionismo, mas fica bastante difícil ir contra o que o mercado dita”, diz.

Ele pontua ainda que, mesmo quando questões que surgem como demandas sociais são apropriadas pelas galerias, a lógica do bom gosto e refinamento está sempre implícita. “Além do que, as galerias que se pensam criticamente são exceções, não a regra”.

Para a presidente da ArtRio, Brenda Valansi, hoje em dia já existe a compreensão de que junto com o valor artístico e também o olhar, as obras são ativos com valorização. “Isso tem muita influência do crescimento das feiras no país e o trabalho intenso de estimular o conhecimento e a acessibilidade a informações sobre arte”, afirma.

Entender esse cenário em crescimento é importante também para saber diversificar os investimentos, o que faz parte do perfil de todo bom investidor. No mercado da arte, isso significa comprar obras de diferentes artistas, não apenas dos mais famosos, e estar ciente de que nem toda arte vale milhões, mas todas têm seu valor e podem surpreender.

O cenário vem mudando, também, porque além do fato de que o interesse por obras de arte era ainda menor do que é hoje, havia o fato de que até pouco tempo atrás a participação de pessoas físicas nos investimentos em ativos alternativos era muito baixa, principalmente por não ser uma modalidade muito difundida e por não ter tantas ofertas.

Com as mudanças nos últimos anos tanto nas possibilidades oferecidas por corretoras como na popularização do mercado de artes, os dois fatores se juntaram e o resultado foi um número crescente de investimentos. “Entendo como um elo importante deste segmento sob a ótica do valor econômico da obra, uma vez que é um bem. Existe uma demanda crescente para o seguro de obras de arte, o que coloca a obra no patamar de patrimônio não apenas artístico cultural”, observa Brenda.

Obra: Insolação de Rafael Alonso |Foto: Divulgação/ArtRio

Assim, até mesmo quem nunca pensou em investir em arte e tem em mente outros tipos de investimento, pode acabar se interessando pela área a partir da recomendação dos analistas das corretoras que selecionam e indicam os melhores ativos dependendo do perfil de cada pessoa e dos objetivos da aplicação, focando em diferentes estratégias para maximizar os resultados.

Em relação aos valores, as peças mais clássicas ainda são bastante caras. Mas há opções diversas, de artistas contemporâneos, com preços que não são exorbitantes e que podem ter um bom retorno no futuro. “Uma coleção não precisa começar com obras de artistas consagrados e já no topo da carreira. Existem artistas jovens, promissores, e múltiplos de artistas consagrados, que são uma boa opção para esse início”, aconselha a presidente da ArtRio.

Um novo modelo de negócios para quem quer investir em obras de arte é pelas NFTs (sigla para “tokens não fungíveis”, em português). Segundo levantamento da DappRadar, que acompanha o mercado de NFTs, só em 2021 foram movimentados mais de U$ 21 bilhões.

No Brasil esse mercado ainda é pouco conhecido, mas, para quem busca opções diferentes de investimentos e gosta de artes, é uma área que vale acompanhar para entender melhor as transformações e o que o futuro reserva.

O ideal é, portanto, procurar uma investidora que tenha a arte como opção, contar com a orientação dos especialistas e, antes de tomar a decisão final, ter um pouco mais de contato com obras e artistas, para entender o mercado.

Vantagens e riscos de aplicar dinheiro em arte

Entre os fundos de investimento tradicionais, os principais são os de renda fixa, como Tesouro Direto, CDB (Certificado de Depósito Bancário), LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e LCA (Letra de Crédito do Agronegócio). E os de renda variável, como as ações. Cada um tem suas características específicas.

Há também os chamados “ativos alternativos”, que são soluções criativas para quem quer proteger o patrimônio e buscar lucros, mas não são tão divulgados porque se tratam de opções fora do convencional. É nesse cenário que as artes se encaixam.

A cantora e compositora Lari Ferreira
A cantora Lari Ferreira, cujas composições são ativos financeiros para investidores | Foto: Divulgação

No site da Empiricus Investimentos, por exemplo, já há uma página dedicada aos Ativos Alternativos, indicando que os clientes invistam em ativos que estão fora do radar do mercado clássico de capitais, como as obras de arte.

De acordo com a investidora, “ter uma carteira de investimentos diversificada já é meio caminho para o sucesso financeiro”. A segurança e o alto potencial de retorno são outros pontos positivos citados. Por esses motivos, muitos estão optando pelos ativos alternativos.

Além disso, o investimento em arte é um meio termo: mais rentável que investimentos em renda fixa e menos volátil que ações, já que as obras são descorrelacionadas da Bolsa de Valores e não sofrem as interferências das oscilações muitas vezes bruscas do mercado financeiro.

Mas vale lembrar que as negociações das obras estão sujeitas à cobrança de 15% do Imposto de Renda sobre o lucro. E que, por serem considerados ativos de renda variável, não são protegidos pelo Fundo Garantidor de Crédito – que protege os investimentos de renda fixa como CDB e Poupança. O risco é todo do investidor.

Uma das principais vantagens é que as obras de arte são aceitas em todo o mundo, independentemente do país onde o investimento tenha sido feito. Portanto, se acontecer de o mercado brasileiro entrar em crise, há a possibilidade de vender ou leiloar a obra em outros países. Mesmo sendo um tipo de investimento com custos mais altos, é possível ganhar dinheiro.

Entre as desvantagens, está a barreira para fazer parte desse mercado, especialmente em relação à falta de conhecimento para quem está começando. E o próprio custo das obras, que não é barato.

Outro ponto é o custo com manutenção, já que as obras de arte de grande valor demandam cuidados específicos em relação ao armazenamento, à exposição e outros fatores.

É importante entender que a arte é, geralmente, um investimento a longo prazo. E que o valor pode aumentar significativamente, se manter estável ou cair. Não é um investimento para quem quer ganhar dinheiro rápido ou até mesmo liquidar o que foi investido. Por isso, se o objetivo é um retorno em curto prazo, ou se por algum motivo o investidor não pode deixar seus recursos aplicados por um período maior de tempo, o investimento em arte pode não ser uma boa opção.

Antonio van Moorsel, estrategista-chefe e sócio da Acqua Vero – assessoria de investimentos sócia do BTG Pactual, explica que a diversificação nos investimentos é sempre importante. No entanto, é necessário distinguir oportunidades de investimentos bons e ruins. “Se tratando de investimentos alternativos, como é o caso de arte, por exemplo, quanto mais específico for o objeto subjacente, mais complexa é a análise. E, no geral, é algo que depende de análise profissional. Portanto, é necessário que haja bastante cautela”, diz. 

Ele recomenda ainda que, também por esta razão, o valor investido relativo ao patrimônio total seja de, no máximo, 1%. “Via de regra, são investimentos cuja liquidez é questionável, ou seja, é importante considerar a necessidade do recurso antes de investir, para evitar que gere frustrações futuras”, orienta.

Afinal, a arte é realmente uma opção lucrativa?

Esta pergunta é a principal entre as pessoas que pretendem buscar esse tipo de investimento, principalmente por ser um mercado mais fechado e aparentemente difícil de ser compreendido, o que gera muitas dúvidas.

Por isso é importante pesquisar muito e contar também com o auxílio de um profissional da área. Frequentar galerias ou leilões, mesmo que inicialmente ainda não tenha a intenção de comprar, é uma forma de começar a aprender e entender mais sobre o mercado de artes. E conversar sempre com especialistas que poderão ajudar a tomar as melhores decisões.

A presidente da ArtRio indica comprar em galerias que tenham histórico de atuação reconhecido. “Essas galerias poderão dar todo o suporte de informação e técnico sobre a obra, além da certeza da autenticidade. As feiras também são excelentes opções, onde é possível encontrar uma grande diversidade de artistas e plataformas, quando as galerias selecionam seus melhores trabalhos”, orienta.

República da desigualdade - Meritocracia seja louvada
Obra: A República da Desigualdade, de Hal Wildson |Foto: Divulgaçao/ArtRio

De modo geral, existem três tipos de galerias de arte. As primárias são aquelas onde a obra do artista vai direto para a galeria e fica exposta, além de ter apoio para exposições em mostras temporárias de museus e em bienais. As secundárias são aquelas para onde as obras vão apenas para serem vendidas, sem funcionar como um espaço de arte. Muitas vezes as obras saem de galerias primárias e vão para as secundárias – acompanhar esse processo ajuda a entender melhor os valores e rendimentos de algumas obras. E, ainda, as casas de leilão, que também atuam apenas com a venda, mas em um outro formato.

O aumento do número de pessoas que têm buscado esse tipo de investimento fez com que crescesse também a profissão de consultor de arte. Esses profissionais atuam pesquisando o mercado, encontrando obras e aconselhando os possíveis investidores.

Benda destaca o papel do curador e do “art advisor”, que considera ser de extrema relevância. “São esses profissionais que irão auxiliar o colecionador ou o investidor na linha que definirá o perfil da coleção – período, perfil de artista, técnica, visibilidade da obra, potencial de valorização”, diz.

O historiador da arte cita outros dois pontos que considera essenciais: levar em consideração o fato de que se está lidando com objetos que são precificados a partir de valores subjetivos; e que se trata, no fim das contas, de objetos caros. “Um investidor que só está interessado no lucro precisará de um consultor, de um conhecedor de arte. Mas pode acontecer também de um investidor se apaixonar pelos objetos, assim como pode acontecer de um colecionador apaixonado investir pensando no lucro”, afirma.

Vale lembrar que o lucro não é garantido, assim como em outros tipos de investimento. Mas, fazendo boas escolhas, há sempre a possibilidade de haver uma peça com grande potencial de retorno ao longo do tempo.

Ou seja, mesmo se as ações estiverem em baixa, a arte na qual você investiu pode manter o valor ou até mesmo ganhar um valor maior. Porém, é um tipo de investimento que demanda paciência e planejamento.

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