Tom Leão
Amo cinema e amo música. Mas não sou mega fã de musicais. Nem no teatro, nem na telona. Embora não me recuse a vê-los. Sempre há algum que vale a pena. Como meu trauma infantil, “A Noviça Rebelde”. Foi assim: passeando com minha mãe pela Cinelândia carioca, em algum ponto dos anos 70, o Metro exibia “2001”, com aquela estação espacial belíssima no cartaz, e o Palácio, mais adiante, reprisava “The Sound of Music”. Mamãe escolheu ver este. Fiquei chateado e ‘garrei ódio’ da noviça. Só a perdoei, duas décadas depois, quando assisti ao filme com minha mulher e meu filho. Todos amamos. A trama é ótima. O que acabou por resultar numa ida a Salzburgo, para fazer o ‘Passeio da Noviça Rebelde’, pelos cenários reais do filme, que só turista conhece. Alemães e austríacos, ignoram.
Tudo isso, para dizer que, há alguns musicais que amo de paixão. Como as óperas-rock “Tommy”, de Ken Russell (baseado em álbum conceitual do The Who, estrelado pelo próprio Roger Daltrey, já vi ‘trocentas’ vezes), e “O Fantasma do Paraíso”, de Brian DePalma (um de seus melhores e mais subestimados filmes). E o clássico dos clássicos, “Cantando na chuva” (um dos melhores filmes da História e história do cinema), que, de certa forma, é emulado na recente extravagancia, “Babilônia”.
Mas, existem aqueles duros de engolir, é claro. Como a versão filmada do álbum dos Beatles, “Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band” (1978), que virou um filme odioso, estrelado pelos Bee Gees e Peter Frampton. Não tinha como dar errado: a fonte das músicas (Beatles) e o produtor, Robert Stigwood, dos vitoriosos “Tommy” e “Os embalos de sábado à noite”. Mas, deu. Tanto, que o filme está fora de circulação, sumiu. Vi, porque tinha rock na trilha e não tinha nada pra fazer. No elenco, nomes como Alice Cooper, Aerosmith, Earth, Wind & Fire, serviam de isca.
Outro BEM ruim é “A música não pode parar” (‘Can´t stop the music’, 1980), com o Village People. Veio no fim da fama do grupo (do qual é uma pseudo biografia), e é extremamente doloroso de aturar. Nada se salva neste desastre, que, para mim, é o pior de todos os tempos. Também sumiu.
Na mesma época deste, veio “Xanadu” (1980), um troço sem pé, nem cabeça, feito para ‘estourar’ Olivia Newton-John nos Estados Unidos, depois do sucesso dela em “Grease”. Neste, Olivia faz uma das sete musas inspiradoras, Kira, que desce do Olimpo e enfeitiça um artista gráfico (o canastrão John Beck, de ‘Warriors’) e reacende a paixão do dançarino oldskool, feito pelo grande Gene Kelly (em seu último papel no cinema). E, juntos, abrem uma mega casa de espetáculos, a Xanadu do título, em plena onda da patinação dançante da época.
E, chegamos ao filme israelense “A Maçã” (‘The Apple’, 1980), que motivou esta coluna. Uma das coisas mais estranhas que o cinema já produziu. É um musical ‘rock’, que mistura sci-fi e disco music (!), passado em 1994, quando todo mundo usaria glitter, roupas prateadas e falaria afetado. A trama, empresta o mito bíblico de Adão e Eva, ao mostrar uma dupla de cantores românticos, Bibi e Alphie, que participam de um festival ao estilo Eurovisão. Então, Bibi é tentada pelo diabólico dono de gravadora, Boogalow (o próprio diabo!) e vira uma popstar de sucesso, deixando Alphie na miséria. A maçã do título representa a tentação em que Bibi (ela, em vez dele) cai.
O diretor e produtor Menahem Golan (que, junto com Yoram Globus, foram donos da Canon, a maior produtora de filmes ruins dos anos 80) achava que “A Maçã” ia virar cult. Mas, foi vaiado em sua estreia, todos riram dele. Golan, tentou se suicidar, se jogando da sacada do hotel, no que foi acudido pelo sócio. Ainda bem. Ou, não teríamos clássicos da Canon, como “Lifeforce” e vários filmes com Chuck Norris e kickboxing.
Visto hoje (acabou de sair em HD), “A Maçã” quase (quase) entra na senda do cult. Golan, achava que ele ia ser um novo “The Rocky Horror Picture Show”, por suas ‘qualidades’. Mas, se até “Xanadu” (com trilha da Electric Light Orchestra) teve uma segunda chance, na Broadway (foi até encenado no Brasil, sem sucesso), onde as pessoas iam justamente para zombar dele e cantar juntos — quem sabe, um dia, isso não pode ocorrer com “A Maçã”? Se você não morrer de rir (ou vomitar) com o final absurdo, pode até apreciar umas 4 ou 5 músicas lá, assinadas por George S. Clinton (que não é o do funk).