Reinaldo Glioche
Principal estreia dos cinemas brasileiros nesta quinta (12), “Os Fabelmans” é o 34º longa-metragem de Steven Spielberg para cinema e é seguro dizer que é o seu mais pessoal.
Isso porque o filme aborda a infância e adolescência do cineasta, sua paixão por cinema e relações familiares. Tudo sob o pilar da autoficção, técnica usual na literatura e mais recentemente no cinema em que se costura elementos autobiográficos com ficção.
Grande vencedor da 80ª edição do Globo de Ouro, com os troféus de direção e filme dramático, a produção também está indicada ao Critic´s Choice, ao SAG e ao DGA. Deve receber, ainda, múltiplas indicações ao Bafta, maior prêmio do cinema britânico, e ao Oscar.
“Os Fabelmans” se inicia justamente com o pequeno Sam – o alterego de Spielberg vivido pelo fantástico Gabriel LaBelle – sendo apresentado ao cinema e se apaixonando perdidamente à primeira vista. A partir daí vemos como ele vai desenvolvendo criativamente essa paixão e consolidando o desejo de filmar, de registrar, de criar, de ser diretor de filmes.
A relação com a mãe, vivida por Michelle Williams, é uma bússola para o jovem Sam em uma família rodeada por mulheres – ele tem três irmãs. A tumultuada relação com o pai – vivido de maneira sutil e afetuosa por Paul Dano – tem no filme um gesto de reparação.
Os sabores e dissabores da adolescência, bem como as percepções a respeito do poder do cinema, se confundem nessa apaixonada elaboração que é “Os Fabelmans”. Há grandes momentos que tangenciam essa condição, como quando ao montar um filme que se pretende homenagem a mãe que perdera um ente querido, o jovem Sam descobre algo que mudará sua vida e sua maneira de fazer filmes para sempre. Outro grande momento é quando o valentão da escola rui ao perceber que jamais estará à altura da imagem que projeta.
São duas cenas emblemáticas da psicologia spielbergiana e que ajudam a entender o porquê de “Os Fabelmans” ser o franco favorito na vigente temporada de prêmios. Não é apenas por ser um filme sobre cinema – ou sobre Spielberg – e, portanto, o ato masturbatório por excelência em uma indústria que adora premiar filmes sobre filmes e sobre quem faz filmes.
Para além dessa realidade que, sim, influencia toda a política decisória na Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, “Os Fabelmans” é um filme que tem algo a dizer sobre muitos temas caros aos votantes do Oscar e a chance de premiar Spielberg, o homem que praticamente inventou Hollywood como a conhecemos hoje, por um filme em que ele fala sobre como tudo começou é simplesmente a cereja do bolo.
A vocação autocongratulatória de Hollywood não é nova, mas há algo de especial em um filme que coloca David Lynch para interpretar John Ford. Quem gosta de cinema não tem como ficar impassível diante disso. O Oscar tampouco.