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Em busca de Romeu

Por Jéssica Stuque

O espetáculo “Eu, Romeu – Protagonismo Suburbano” está em cartaz até o dia 29 de janeiro no Teatro de Arena Eugênio Kusnet. A peça é encenada por Marcos Camelo e dirigido por Cecília Viegas, da Adorável Companhia.

Culturize-se conversou com o ator Marcos Camelo sobre o espetáculo e ele deu detalhes sobre a montagem, que faz uma releitura do clássico de Shakespeare ao mesmo tempo em que conta a trajetória artística do ator. Confira a entrevista abaixo. 

Culturize-se: Qual o diferencial da abordagem da Adorável Companhia para a história de Romeu e Julieta? 

Marcos Camelo: A Cecília é bailarina e artista de circo. Eu sou ator e palhaço. A origem da Cecília não é o teatro e ela olha com menos respeito para alguns símbolos, o que é muito bom. Ela disse que não gostava da história e que eu jamais poderia ser o Romeu. Nas palavras dela: “O Romeu entra em uma festa de penetra e volta para a casa da menina de madrugada, mata uma pessoa porque ficou irritado, já eu era o maior para-raio de polícia”. Foi esse apontamento dela o maior tesouro deste trabalho, porque possibilitou a gente construir uma dramaturgia que vai entrecortando as duas histórias: a história de Romeu e Julieta e a minha história com a perspectiva de um ator pardo, do subúrbio do Rio de Janeiro que em teoria jamais poderia ser o Romeu. 
 

C: Em uma parte da peça, você diz: “Se você tivesse que escolher um ator para dar vida a Romeu, como ele seria?”. Você chegou a viver alguma situação em que não foi escolhido para o papel por conta do estereótipo?
 

MC: Eu tive uma passagem pela escola de teatro muito dura. Demorou para que a escola fosse um lugar confortável. Uma vez, a turma fez Shakespeare e o professor avaliou todo mundo muito bem, de forma afetuosa e acompanhou o semestre inteiro cada aluno. Ele me tratava com muita normalidade, mas na avaliação ele me disse: “Talvez você tenha desperdiçado a única chance da sua vida de fazer Shakespeare”. E aquilo foi um baque, um tapa na minha cara. Eu fiquei pensando: “mas por que eu só vou ter chance de fazer Shakespeare na escola de teatro?” Eu não entendia, porque minha atuação não era tão ruim assim para ter uma avaliação tão diferente. 
 

Foto: Silvia Patrícia

C: Você chegou a temer que a peça ficasse “muito pessoal”?

MC: A gente tomou muito cuidado para não “pessoalizar” e não trazer o olhar de vítima para as pessoas. Há momentos na peça em que também coloco quando o Marcos é opressor, quando é machista com mulheres.

C: Que elementos você usa em cena? 

MC: Meu trabalho como ator traz muito da minha experiência do palhaço, de se relacionar com a vida com o corpo, como se pensamento e corpo fosse uma coisa só. É um trabalho muito físico e musicalmente toco pandeiro e canto. Também falo diretamente ao público, sem a ilusão da quarta parede.

C: Quantos personagens você interpreta?
MC: Até eu já perdi a conta. Eu vou brincando com os personagens: faço texto do Romeu, da Julieta, da mãe de Julieta, de amigos da Julieta e do Romeu, o frei… devem ser uns 5, 6.


C: Na peça, Romeu mata Teobaldo e não é condenado à morte, como deveria ter sido. Como essa situação é abordada na montagem? 

MC: Nós trazemos dados reais de dados prisionais de homens pretos de São Paulo que são condenados por tráfico de drogas em número muito superior ao de homens brancos. Enquanto homens pretos são presos como traficantes, há uma grande chance de homens brancos serem considerados usuários portando a mesma quantidade de drogas. 

C: É a primeira vez da peça em São Paulo?
MC: Sim! A peça estreou no Sesc de Goiás, em março de 2020. Veio a pandemia e migramos para o formato online. E quando tudo foi abrindo novamente, circulamos para Minas Gerais, Amazonas, Bahia, além do Rio de Janeiro. Mas em São Paulo, é a primeira vez. Ganhamos esse edital agora para ocupar o teatro da Funarte e esperamos que seja a semente para futuras parcerias. 

Foto: Silvia Patrícia

Serviço

Espetáculo “Eu, Romeu– Protagonismo Suburbano”, da Adorável Companhia

Temporada: 6 a 29 de janeiro de 2023 | Horário: 20h (sextas-feiras e sábados) e 19h (domingos)

Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia-entrada)

Classificação indicativa: 14 anos

Duração: 1h

Local: Teatro de Arena Eugênio Kusnet – Sala Augusto Boal

Rua Dr. Teodoro Baima, 94 – Vila Buarque – São Paulo (SP)

Entrevista originalmente publicada na edição 3 da newsletter Teatro que o Culturize-se dispara para assinantes e membros do Clube Culturize-se às sextas-feiras. Clique aqui para assinar.

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