Redação Culturize-se
A cotação do dólar superando a marca histórica de R$ 6 no Brasil tem sido acompanhada com apreensão por economistas, analistas e investidores. Embora fatores conjunturais tenham contribuído para essa disparada, há sinais de que essa valorização da moeda americana pode se consolidar, tornando-se um novo patamar de referência no câmbio brasileiro. Essa percepção é sustentada tanto por questões internas quanto externas, configurando um cenário de incertezas para o médio prazo.
O recente aumento do dólar foi impulsionado por medidas econômicas anunciadas pelo governo brasileiro, que não atenderam às expectativas do mercado. Entre elas, destaca-se o pacote fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que, embora tenha proposto cortes de gastos, também incluiu mudanças tributárias consideradas arriscadas pelos agentes econômicos. A isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil, por exemplo, gerou desconfiança, tanto pelo impacto estimado de R$ 35 bilhões quanto pela proposta de compensação, que previa maior taxação sobre os mais ricos.
Essa combinação de medidas não apenas gerou “ruído”, como admitido pelo próprio ministro, mas também provocou uma onda de incerteza no mercado. Segundo Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, o real já opera em um nível muito depreciado, bem abaixo do que seria considerado justo, que hoje estaria em torno de R$ 4,85. Contudo, a falta de confiança no compromisso do governo com a sustentabilidade fiscal fez o dólar ultrapassar a marca simbólica de R$ 6.
O dólar em alta exerce uma pressão significativa sobre a inflação, já que muitos produtos e insumos no Brasil são dolarizados. Essa dinâmica obriga o Banco Central a adotar medidas para conter os impactos inflacionários, incluindo a possibilidade de elevação da taxa Selic. A curva futura de juros já precifica um aumento para 14%, reforçando o custo da dívida pública e pressionando ainda mais as contas do governo.
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Além disso, a desvalorização do real amplia o custo de dívidas atreladas ao dólar, uma preocupação para empresas que têm passivos em moeda estrangeira. Apesar disso, setores exportadores, como os de alimentos e commodities, tendem a se beneficiar, com destaque para empresas como JBS e Weg, que têm boa parte de suas receitas vinculadas ao dólar.
No cenário internacional, a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos trouxe preocupações adicionais. As medidas protecionistas prometidas por Trump, como subsídios internos e tarifas sobre importações, podem fortalecer ainda mais o dólar, enquanto enfraquecem economias dependentes de comércio exterior, como o Brasil.
A política fiscal expansionista nos EUA também pode pressionar o Federal Reserve (Fed) a elevar as taxas de juros, atraindo capital estrangeiro para a economia americana. Essa dinâmica tende a manter o dólar valorizado, especialmente em relação a moedas mais voláteis como o real.
O dólar a R$ 6 é o novo normal?
Embora o dólar acima de R$ 6 seja visto por muitos como uma anomalia, há sinais de que essa realidade pode persistir. Especialistas apontam que a falta de confiança no governo brasileiro, combinada com as incertezas do cenário global, cria um ambiente de alta volatilidade no câmbio. O mercado espera uma gestão fiscal mais sólida e eficiente. Caso contrário, o patamar atual do dólar pode se consolidar.
Para que o dólar retorne a patamares mais baixos, será crucial que o Banco Central seja eficaz no controle da inflação e que o governo Lula implemente medidas mais claras e robustas de ajuste fiscal. A recente depreciação do real não é apenas um reflexo de condições externas adversas, mas também de escolhas políticas internas que minaram a confiança dos investidores.
No curto prazo, o dólar a R$ 6 parece mais uma consequência de um contexto de desancoragem das expectativas econômicas do que uma tendência estrutural irreversível. Contudo, sem uma mudança significativa na abordagem fiscal e na comunicação do governo, esse patamar pode se consolidar, agravando os desafios econômicos do país. O que está em jogo não é apenas a cotação do dólar, mas a própria credibilidade da política econômica brasileira em um cenário global cada vez mais competitivo e incerto.