“Hackney Diamonds” devolve a grandeza da banda, no som, nas colaborações e no conceito, mas traz também um ponto de inflexão para os Rolling Stones
Por Reinaldo Glioche
A voz rouca e nasalada de Keith Richards canta “Is my future all in the past? Yeah/Tell me straight, tell me straight” em um dado momento de “Tell me Straight”. Já em “Dreamy Skies”, a melancolia enuncia a necessidade de se libertar de tudo (Break away from it all) e por assim vai. “Hackney Diamonds”, primeiro álbum de inéditas dos Stones em 18 anos, revela uma banda encarando a finitude nos olhos, mas com energia, gratidão e generosidade.
A sabedoria permeia um álbum, produzido por Andrew Watt, que abraça a melancolia e faz dela um ponto de conexão com a audiência, mas também com as possibilidades. Sem pressões, mas com muita presença de espírito. Da divertida e leve “Mess It Up” à revisionista “Rolling Stones Blues”, a banda se mostra pronta para dizer adeus, mas não decidida a fazê-lo.
Isso vai ao encontro de algumas manifestações recentes de Mick Jagger, que demonstrou predisposição a realizar turnês póstumas. Isso mesmo! O frontman dos Stones, em entrevista ao Wall Street Journal, aventou a possibilidade de fazer turnês mesmo depois de morto, alimentando tanto seu espólio quanto o legado da banda. “Dá para ter um negócio póstumo agora, né? Dá pra fazer uma turnê póstuma. A tecnologia avançou desde o negócio do Abba”, observou.
Keith Richards não descarta a possibilidade. “Eu quero que isso aconteça? Aí é outra história,” adicionou o guitarrista.
Essa é uma questão incomum, mas que dá dimensão do tamanho dos Rolling Stones na história da música. São 60 anos de carreira, mais de 60 álbuns, entre trabalhos de estúdio, compilações e gravações ao vivo e muitos paradigmas pelo caminho.
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A relevância de dinossauros como os Stones, que em “Hackney Diamonds” é celebrada com a presença de Paul McCartney, Lady Gaga, Elton John, entre outros, se torna ainda maior pelo fato de que bandas com essa abrangência, com uma longitude tão grande e exponencial não estão surgindo desde os Foo Fighters nos idos dos anos 90. Em parte porque o interesse geracional se deslocou para o K-Pop e em parte porque o rock atualmente prescinde da primazia de outrora em um sentido tanto cultural como musical.
Enquanto os Stones discutem sua perenidade, o U2, outra banda monumental, fixa residência em Las Vegas, tocando no novíssimo Sphere, optando por uma abordagem diferente no debate para se aferir a maior banda de todos os tempos.
Nessa contenda informal, que muitos ainda incluiriam Aerosmith, Beatles, The Who, Guns and Roses, entre outros, os Rolling Stones entregam um excelente argumento na forma de “Hackney Diamonds”. “Deixe os velhos acreditarem que ainda são jovens”, bradam na balada soul “Sweet Sounds of Heaven”.