Falecido há mais de uma década, o centenário de Millôr Fernandes nos dá a oportunidade de nos reconectar com sua obra
Aline Viana
Nesta quarta-feira, dia 16 de agosto, celebramos os 100 anos de Millôr Fernandes (1923-2012), escritor, tradutor, dramaturgo, poeta, desenhista e jornalista. Millôr era um intelectual de imprensa e um ser profundamente político. Mais do que ser reconhecido pelo seu texto ou pelos desenhos, Millôr era conhecido de norte a sul pelo estilo sarcástico inconfundível.
Seu primeiro emprego propriamente dito foi na revista “O Cruzeiro”, onde era uma espécie de faz tudo. Seus primeiros trabalhos com texto, porém, saíram na revista O Guri, do grupo Diários Associados, onde fazia traduções das tirinhas de Flash Gordon – ao longo de toda a vida, Millôr atribuía aos quadrinhos sua facilidade com o humor.
A primeira coluna assinada, contudo, saiu na revista “A Cigarra”, a pedido de Frederico Chateaubriand, para cobrir um colunista que atrasou o envio do material. Foi quando ele, aos 19 anos, criou a coluna do Vão Gogo, já repleta de frases, versos e tiradas inteligentes e engraçadas.
Na explicação de Millôr, Emmanuel Vão Gogo combinava o “altamente plástico” (Van Gogh) ao “altamente filosófico “(Emannuel Kant), sendo também um boquirroto.
Dali em diante, a coluna do Millôr passou a ser parte da receita de sucesso de publicações como “Correio da Manhã”, a revista de humor “Pif Paf” (fundada por ele), revista “Veja”, o celebre “O Pasquim”, revista IstoÉ, Jornal do Brasil, O Estado de S. Paulo, O Dia, Folha de S. Paulo, etc.
Millôr era famoso pela ironia fina mirada em todos: não perdoava esquerda, nem direita, nem os de cima e só um pouco aos de baixo.
Autodidata no idioma inglês, ele traduziu várias peças de William Shakespeare e Moliére. As obras ainda podem ser encontradas em edições de bolso da L & PM Pocket – coisa fina e acessível (inclusive no formato e-book), qualidades quase impossíveis de serem combinadas hoje em dia.
Também podem ser encontradas pela mesma editora as coletâneas “Millôr Definitivo” e “Millôr Definitivo – uma bíblia do caos” (versão reduzida da primeira). Outra obra que merece atenção do leitor deste Culturize-se é “O livro vermelho dos pensamentos de Millôr” (L & PM Pocket).
Depois dessa breve introdução ao leitor sobre quem foi Millôr Fernandes, apresentaremos uma breve seleção de frases do autor para que, definitivamente conquistado, o leitor ou a leitora (para nos darmos ares de Machado de Assis) se junte de forma irrevogável ao time de fãs do homem.
- “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.”
- “O adultério sempre existiu. A tecnologia é que tornou tudo mais claro.”
- “A ocasião em que a inteligência do homem mais cresce, sua bondade alcança limites insuspeitados e seu carácter uma pureza inimaginável é nas primeiras 24 horas depois da sua morte.”
- “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim.”.
- “Um homem começa a ficar velho quando já prefere andar só do que mal acompanhado”.
- “Livre como um táxi.”
- “Ser pobre não é crime, mas ajuda muito a chegar lá.”
- “Uma coisa eu lhe garanto, amigo – o seu complexo de inferioridade não é inferior ao de ninguém.”
- “A verdadeira arte abstrata é uma coisa sem pé nem cabeça.”
- “É inegável que a leitura melhora fundamentalmente o ser humano. Desde que, claro, ele seja alfabetizado. Já a televisão piora até o analfabeto”.
- “Mordomia é ter tudo que o dinheiro – do contribuinte – pode comprar.”
- “Quando, um ano depois, você encontra uma carta que devia ter respondido e não respondeu, bem, já respondeu.”
- “Os nossos amigos poderão não saber muitas coisas, mas sabem sempre o que fariam no nosso lugar.”
- “O cadáver é que é o produto final. Nós somos apenas a matéria-prima.”
- “As mulheres são mais irritáveis porque os homens são mais irritantes.”
- “Às vezes você está discutindo com um imbecil… e ele também.”
- “Fiquem tranquilos os poderosos que têm medo de nós: nenhum humorista atira pra matar.”
- “Celebridade é um idiota qualquer que apareceu no Faustão.”
- “O capitalismo não perde por esperar. Em geral ganha 6% ao mês.”
- “Todos os países são difíceis de governar. Só o Brasil é impossível”.
Para saber mais:
Veja a entrevista de Millôr Fernandes ao Roda Viva da TV Cultura