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Verificação nas redes sociais impõe reflexão sobre nosso zeitgeist

Debate em torno da verificação nas redes sociais submerge um debate muito mais importante sobre para onde as redes sociais estão indo

Por Reinaldo Glioche

Muito tem se falado de verificação nas redes sociais. Desde que Elon Musk comprou o Twitter, fez com que perdesse metade do valor de mercado e recebe críticas a torto e a direito, grande parte da atenção está no fato de que o bilionário decidiu cobrar para verificar usuários. Para além de enxergar uma possibilidade de rentabilização desperdiçada, o empresário entende que atrelar a verificação a uma mensalidade coíbe a ação de bots, que é algo ainda muito subestimado em sua visão no Twitter, em particular, e nas redes sociais como um todo.

Todo esse imbróglio se dá em um contexto de aumento da pressão na Europa e nos EUA, mas também no Brasil, por regulação das mídias sociais, que têm sido lenientes com a proliferação de fake news. Musk acredita que essa verificação onerada vai disciplinar o comportamento no Twitter e, mais cedo do que tarde, deixar muito claro quem é bot ou perfil fake e quem não é. Mark Zuckerberg parece concordar com ele e já anunciou medidas semelhantes para seu Instagram e o moribundo Facebook. Na Oceania, a verificação já está disponível para todos. Por um preço.

Foto: Reprodução/Twitter

Esse movimento também pode ser percebido como uma resposta das big techs não apenas ao impulso por regulamentação e responsabilização civil e penal a discursos de desinformação e atos de violência – como nos recentes ataques a escolas no Brasil -, como de regulação de remuneração a empresas de mídia, já que o setor é usurpado pelo modelo de negócio de Google, Facebook, Twitter e congêneres.

Some-se a esse cenário o fator TikTok, que não é uma rede social, a despeito do equívoco comum de rotulá-lo dessa maneira, e que, como observado nesta reportagem de Culturize-se, pode precipitar o fim da era das redes sociais, o grande esteio cultural do começo do século XXI.

Cenário adverso

O Vale do Silício está em pânico e em busca da próxima energia disruptiva. A queda de receita está em velocidade vertiginosa e uma escala de demissões jamais vista tomou de arrastão de startups a gigantes como Amazon. Enquanto isso, empresas não americanas tentam avançar no mercado global oferecendo ao consumidor aquilo que ele costumava ter de graça em suas redes sociais preferidas. É o caso do indiano Koo, grande frisson no fim de 2022 no Brasil.

O chinês TikTok, por exemplo, é alvo de acusações de espionagem na Europa e nos EUA e enfrenta resistência de governos que buscam alternativas – uma venda da operação do app nos EUA e Europa é considerada – para evitar a drástica medida de um banimento. No entanto, o estado de Montana, no meio oeste americano, acaba de proibir o app, o que deve levar a uma rodada de disputas nos tribunais.

Foto: Getty

A raiz do problema

O ônus de combater as fakes news não deve ser do usuário, mas sim das redes sociais que devem desenvolver mecanismos sofisticados para desmobilizá-las, assim como não cabe às big techs pagar pela atividade-fim das empresas jornalísticas. O problema não pode ser empurrado para a frente e, talvez por isso, a regulação se faça necessária. Mas como fazê-la de maneira a atender o bem comum em meio a lobbies tão agressivos?

Neste cenário, a medida de cobrar por verificação não é tão ruim. Uma empresa privada tem a prerrogativa de explorar alternativas para a viabilidade de seu negócio, mas, como de hábito, a discussão sobre a verificação está enviesada. Os verificados por legado, isto é, aqueles que o foram por ser distintos em suas áreas, ou serem veículos de imprensa ou órgãos oficiais, se ressentem de perder um status que a bem da verdade não perderam. A ideia de cobrar por verificação aqui não se trata de igualar a todos, o presidente do Brasil continuará a ser presidente do Brasil e dispor de canais oficiais para se pronunciar, mas de estimular um uso mais civilizado, rastreável e harmônico das redes sociais.

Ninguém é obrigado a pagar, como ninguém é obrigado a usar as redes sociais. É inegável, porém, que vivemos um momento de ruptura, cujos efeitos ainda não podem ser precisamente calculados.

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