Tom Leão
No dia 24 de março de 1984, cinco alunos de uma high school de Chicago, passaram um sábado pela manhã na detenção, e suas vidas mudaram para sempre. Este é o mote de “O clube dos Cinco” (The breakfast club, 1985), de John Hughes, um dos maiores cult movies teen de todos os tempos. Que marcou não só pelo seu tema, como também, pelas músicas que o sonorizavam.
Muitas vezes, um filme é tão bom quanto a sua trilha sonora. E, as produções juvenis de John Hughes (1950-2009), cujas trilhas de canções pop eram cheias de nomes da geração new wave — sobretudo, de artistas da cena britânica — sempre foram um atrativo à parte. Hughes, foi tão ou mais importante para lançar certos nomes nos Estados Unidos, do que a própria MTV. O que seria do Simple Minds e The Psychedelic Furs sem o impulso internacional que tiveram com músicas nos filmes dele?
Do citado “O Clube dos Cinco” (que, no Brasil, saiu direto em vídeo, por conta de seus temas, um tanto ‘fortes’ para a época, entre os quais drogas e suicídio, o que me levou a uma turnê pelas locadoras da cidade, até achá-lo para alugar) aos agora também clássicos “A garota de rosa-shocking” (Pretty in Pink, 1986) e “Gatinhas e gatões” (Sixteen Candles, 1984), que passam toda hora em canais como Telecine Cult, suas trilhas não só ajudaram a lançar (ou a consolidar) nos Estados Unidos (e no mundo) vários nomes britânicos, ainda em começo de carreira. Como os citados Simple Minds e Psychedelic Furs, mais The Smiths, Echo & the Bunnymen, Yello etc. Também servem como cápsula do tempo. Por estarem diretamente ligadas ao que os jovens, retratados naqueles filmes (e a plateia), se trajavam e realmente ouviam. E, Hughes, pessoalmente, as selecionava.
Foi a partir de “Gatinhas e gatões”, que Hughes (cujo visual remetia ao de um tiozão nerd gente boa) adentrou no universo teen (antes, ele havia escrito o primeiro “Vacation/Férias frustradas”, 1983, que teve várias sequencias, com Chevy Chase), e começou a se fazer notar, desde os subúrbios classe média de Chicago. Este, se passava no dia em que a protagonista Samantha (Molly Ringwald, que se tornaria musa de seus filmes), fazia 16 anos, mas ninguém notava, já que sua irmã mais velha ia casar. O título original, vindo de uma canção interpretada pelos Stray Cats (cover da banda The Crests, lançada em 1958), já dava a dica de como ele batizaria alguns de seus filmes a partir dali: tirados/inspirados em nomes de músicas pop.
No filme seguinte, “O Clube dos cinco”, a música de encerramento, ‘(Don´t you) forget about me’, não apenas catapultou o Simple Minds nos EUA, como se tornou um dos maiores hits mundiais (e da banda), em 1985. Até hoje, a música não pode faltar nos shows.
Mas, a trilha que veio mais coalhada de brit hits, estava por sair: a de “A garota de rosa-shocking” (até hoje, tenho a fita cassete). Esta, não apenas consolidou o obscuro Psychedelic Furs nos EUA (onde a banda britânica reside até hoje), como deu o título original para o filme. ‘Pretty in pink’, é uma faixa do segundo álbum deles, ‘Talk, talk, talk’ (1981), que, na versão americana, foi remanejada no track list, para abrir o disco. A trilha de ‘Pretty in pink’ também trazia outros nomes britânicos, então desconhecidos nas paradas americanas (talvez apenas conhecidos de quem escutava as college rádios), que logo se tornariam populares: New Order (três músicas!), Echo & The Bunnymen (‘Bring on the dancing horses’), OMD (‘If you leave’), Thompson Twins e The Smiths. Todas, obscuras nos EUA.
Simultaneamente a ‘Pretty in pink’, Hughes lançou “Mulher nota 1000” (‘Weird science’, 1986). Desta vez, os americanos Oingo Boingo (banda original do ‘trilheiro’ Danny Elfman, favorito de Tim Burton, que já foi tema de coluna aqui) é que ficaram com a música-título. Contudo, seu filme mais marcante, para além das hostes teen, foi “Curtindo a vida adoidado” (‘Ferris Bueller´s day off’), que fez de ‘Oh, yeah!’, da dupla suíça Yello (que rola nos créditos finais, que tem uma ceninha extra, algo incomum na época), um som recorrente em vários outros filmes. E, até mesmo, em anúncios e intervalos de jogos, nos EUA. É entrar os primeiros acordes de ‘Oh, yeah!’ e todo mundo já sabe. Curiosidade: o protagonista, Ferris, mora no mesmo bairro de outro jovem da época, o Tom Cruise, de “Negócio arriscado”.
Seu último filme teen/new wave, que ele apenas produziu e roteirizou (cabendo a Howard Deutch, futuro marido de Lea Thompson, pais de Zoe Deutch, dirigir), foi “Alguém muito especial” (‘Some kind of wonderful’, 1987), que parece um remake de “Pretty in pink”, trocando o sexo da protagonista (agora, um rapaz, feito por Eric Stoltz), que trouxe uma última leva de novos artistas britânicos. Estão nela: The Jesus & Mary Chain, Billy Idol (outro que estourou e foi morar na Califórnia), Propaganda, Flesh for Lulu e March Violets. Hughes (que também foi o roteirista de “Esqueceram de mim”) partiu, cedo demais, aos 59 anos, vitimado por um ataque cardíaco fulminante. Mas, seus filmes (e trilhas) permanecerão.