Por Reinaldo Glioche
Reflexo dos anos Bolsonaro, o cinema brasileiro se interessou pela relação entre religião e conservadorismo e como ela pode nortear muitas das ações do indivíduo. Dos distópicos “Divino Amor” (2019) e “Medusa” (2022), ao lynchiano “Raquel 1:1” (2023), que chega ao circuito comercial depois de bem-sucedida carreira em festivais como SXSW e Guadalajara.
Esse cinema curioso de circunstâncias que contribuem para um fenômeno tanto político como sociocultural apresenta resultados distintos, mas igualmente polarizadores. “Raquel 1:1” está mais interessado em examinar as repercussões de certa misoginia embrenhada em preceitos de muitas igrejas evangélicas.
Para isso, a cineasta Mariana Bastos apoia-se em uma diegética que busca reproduzir vicissitudes especuladas no âmbito midiático e confia à protagonista, a talentosa Valentina Herszage, aqui em um papel ainda mais desafiador do que a apresentou para o cinema em “Mata-me por Favor” (2015), estipular as bases emocionais para os labirínticos conflitos que a trama quer ensejar.
Herzage vive a jovem Raquel, que ao chegar junto com seu pai (Emilio de Mello) a uma pequena cidade do interior, vive acontecimentos misteriosos e causa digressões e rupturas na igreja que frequenta. Bastos mergulha na simbologia e na capacidade de metaforização do que se vê na tela, mas não se preocupa em apontar respostas. Nesse sentido, seu filme é uma experiência irresoluta, como experiências mediúnicas ou espirituais podem frequentemente ser.
“Raquel 1:1” guarda em si todo esse frenesi conceitual enquanto se resolve como um filme que se apropria do contexto religioso, não para explorá-lo, mas para problematizá-lo muito frontalmente. Embora sua premissa seja válida, falta finesse à realização.