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Francês Denis Rouvre usa fotografia para filosofar sobre liberdade

Redação Culturize-se

Há 25 anos, o olhar estrangeiro de Denis Rouvre desembarcava no Brasil, um país que não apenas o acolheria, mas também transformaria sua própria identidade. De “o gringo” e “o francês”, o renomado fotógrafo hoje se orgulha do título de “cearense”, uma conquista que reflete sua profunda conexão com a terra de José de Alencar. “Isso é muito bom porque, quanto mais você acreditar, mais consegue chegar onde quer. E eu vou conseguir. Nasci francês, mas minha vontade é morrer cearense”, declara Rouvre em entrevista ao jornal Diário do Nordeste.

Essa paixão pela cultura e paisagens cearenses não é fortuita. Radicar-se no Brasil representou a concretização de um sonho acalentado desde sua infância em Épinay Sur Seine, nos arredores de Paris. Nascido em 1967, Rouvre trilhou uma carreira internacional de sucesso através das lentes, colaborando com veículos de prestígio como Le Monde, New York Times e Marie Claire, e retratando inúmeras celebridades e artistas de renome mundial.

Com um portfólio que abrange exposições em mais de dez países, seis prêmios de fotografia e nove publicações individuais, Denis Rouvre celebra 30 anos de uma trajetória artística multifacetada. Atualmente, o público cearense tem a oportunidade de mergulhar em sua faceta autoral através da exposição “O Amanhã não Existe”, em cartaz na Caixa Cultural Fortaleza até o dia 20 de abril.

O fotógrafo frances radicado no Ceará, Denis Rouvre | Foto: Arquivo Pessoal

A mostra reúne mais de 50 obras impactantes, habitadas por personagens reais e imaginários, que exploram a resiliência do espírito humano e suscitam reflexões sobre a urgência de um mundo mais sustentável. As fotografias capturam momentos e paisagens emblemáticas do Ceará, como Jericoacoara, Pirambu, a singular Sucata Chico Alves e o histórico Edifício São Pedro.

Além desse núcleo autoral, a exposição oferece um olhar aprofundado sobre a relação de Rouvre com o Brasil, apresentando outras 150 obras vibrantes em cores, ritmos e perspectivas diversas do país. A imersão na jornada artística do fotógrafo francês reforça sua crescente satisfação em ter escolhido o Ceará como lar. “Há 25 anos cheguei no Brasil e encontrei esse lugar ideal para viver. Surgiu em mim uma alegria, uma felicidade de viver o dia a dia… Já encontrei muitas coisas aqui que já foram um sonho na minha vida, sobretudo essa ligação com a natureza. Parece uma coisa muito simples, mas é o contrário, é algo muito rico”, compartilha o artista.

Rouvre, que inicialmente desembarcou no Recife sem domínio da língua portuguesa e sem GPS, revela que a pandemia de Covid-19 o impulsionou a uma introspecção que o levou a “apagar um pouco o que passou” e iniciar um novo ciclo de vida. Após vivenciar diferentes cidades brasileiras, fixar residência em Jericoacoara, há sete anos, pareceu o destino perfeito.

Nesse cenário inspirador, sua fotografia busca imaginar o mundo que almeja. A acolhida calorosa dos cearenses, com seu humor peculiar e a disposição em posar para suas lentes – muitas vezes anônimos habitantes dos próprios locais retratados – é fundamental para nutrir seu processo criativo e conferir autenticidade ao seu trabalho. No ensaio realizado no Edifício São Pedro, por exemplo, os próprios moradores foram os protagonistas das imagens. Para Rouvre, a população cearense demonstra uma “abertura muito grande a imaginar outros mundos”, o que explica a generosa adesão aos seus projetos.

Sua busca por narrativas visuais o conduz frequentemente às margens da sociedade, onde encontra indivíduos resilientes, com “energia para trabalhar, para sobreviver” e uma disposição para o diálogo e a interação. “É essa ligação que faz com que eu me sinta muito mais cearense”, afirma.

Em sua produção autoral, Rouvre explora temas universais através de suas viagens a países como Senegal, Tailândia e Japão, onde fotografou intensamente lutadores. Para ele, a luta é uma metáfora da jornada humana, refletida na profusão de retratos dedicados ao tema. Uma imersão na África, durante seu serviço militar obrigatório, marcou uma profunda transformação em sua perspectiva profissional e pessoal. “Inclusive, ‘O Amanhã Não Existe’ é uma frase que aprendi com eles. Significa ‘hoje é o dia para viver’”, explica, remetendo às experiências vividas no continente africano.

Bruno Ko, curador de “O Amanhã Não Existe”, descreve Rouvre como um retratista cujo foco reside em “empoderar a pessoa retratada”, preferindo suscitar a livre interpretação do público. Na exposição da Caixa, a fotografia é utilizada como um filme, iniciando em uma narrativa ficcional que remete a “Mad Max” para imaginar um futuro possível e, em seguida, confrontar a realidade.

Um dos próximos projetos do fotógrafo será apresentado no Museu da Imagem e do Som do Ceará. A mostra na Caixa Cultural, por sua vez, tensiona questões cruciais para a reflexão cotidiana, como a fragilidade da comunicação em um cenário de colapso energético e a necessidade de um retorno às origens da vida em comunidade, baseada na união e na ausência de preconceitos.

Inquieto e prolífico, Denis Rouvre já planeja um documentário e outras empreitadas visuais. Em Jericoacoara, demonstrou seu engajamento ambiental ao recolher durante 15 dias o lixo marinho para criar figurinos para seus modelos fotográficos, iniciativa também presente na exposição. “Trabalhei sobre o tema da identidade desde o início da minha vida profissional sem saber”, reflete, cada vez mais imbuído do desejo de exaltar a liberdade em suas múltiplas facetas fotográficas.

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