Redação Culturize-se
O Teatro Multiplan MorumbiShopping, em São Paulo, recebe, de 29 de outubro a 28 de novembro, o espetáculo “Por Trás das Flores”, estrelado por Helena Ranaldi e Martha Meola. Com sessões às quartas e quintas-feiras, sempre às 21h, e uma sessão extra de estreia na terça-feira, 29 de outubro, também às 21h, a peça convida o público a imergir em uma narrativa poética que explora a complexa e delicada relação entre mãe e filha.
Ambientada no Norte do Líbano e nas paisagens da imaginação da filha, a trama acompanha o embate entre a mãe, que tenta convencer a filha a voltar ao Brasil e viver com a família, e a filha, que reluta em abrir mão de seu desejo de permanecer no país árabe. Nesse contexto, o espetáculo contrasta as tradições do Líbano com as mudanças culturais e sociais do Brasil, revelando o choque entre as gerações e as diferentes visões de mundo das protagonistas.
A peça também explora a linha do tempo que separa a filha, uma mulher moderna vivendo no século XXI, da mãe, que imigrou para o Brasil em meados do século XX. Ao longo da obra, questões psicológicas, sociais e culturais emergem, aprofundando a complexidade da relação entre essas duas mulheres tão próximas, mas ao mesmo tempo distantes em suas experiências e aspirações.
Um cenário simbólico e minimalista
Segundo o diretor Marcelo Lazzaratto, o cenário da peça foi cuidadosamente pensado para evocar a intimidade e a intensidade emocional da narrativa. A ação ocorre dentro de um quarto em uma antiga casa no Líbano, retratado de forma minimalista por meio de apenas três elementos essenciais: um tapete, um baú e um vaso com uma muda de Cedro-do-Líbano. Esses objetos simbolizam, respectivamente, o espaço interior e as memórias compartilhadas entre mãe e filha.
Um painel de fundo, composto por módulos que remetem a teares, reforça o tema das memórias familiares, sugerindo que a história das personagens é como uma trama que se entrelaça com suas raízes ancestrais. Lazzaratto explica que esses teares “transcendem a vida vivida pelas personagens e acessam elementos de sua ancestralidade”, enriquecendo a narrativa com uma dimensão histórica e mítica.
O tapete, por sua vez, desempenha um papel central na encenação. Intensamente iluminado e inserido em um palco escuro que lembra uma caixa preta, ele representa o espaço de consciência da filha, onde as lembranças e os conflitos emergem. A mãe surge do entorno desse “tapete-consciência”, como se viesse do inconsciente da filha, numa abordagem que remete a princípios psicanalíticos.
As raízes culturais e a psique feminina
O texto de Samir Yazbek, inspirado em suas raízes libanesas, propõe uma profunda exploração da psique feminina, ao colocar em cena dois arquétipos universais: a mãe e a filha. Através de diálogos que revelam traumas familiares e dilemas éticos, o autor constrói uma reflexão sobre as divergências entre Oriente e Ocidente, temas que ressoam diretamente com a formação da sociedade brasileira.
Yazbek destaca que, embora as diferenças geográficas e temporais entre as personagens sejam marcantes, elas compartilham uma necessidade de lidar com seus passados e traumas pessoais. O confronto entre a tradição e a modernidade, materializado no diálogo entre mãe e filha, ressoa com questões mais amplas, como o choque entre valores conservadores e liberais, tão presentes no mundo contemporâneo.
Para o diretor, a peça propõe uma jornada de transformação para as duas personagens, descrita como um “rito de passagem da morte à vida”. A presença simbólica do Cedro-do-Líbano no cenário reflete essa ideia de renovação: o broto de cedro no vaso representa um amanhã de esperança, apesar dos conflitos e das dores enfrentadas pelas protagonistas.
O Cedro, uma árvore milenar e símbolo do Líbano, carrega significados profundos na peça, sendo frequentemente mencionado na Bíblia como um símbolo de grandiosidade e bênçãos divinas. Esse broto, crescendo no canto do palco, é uma metáfora poderosa para a renovação e o ciclo de vida que, mesmo que despercebido pelas personagens, continua a florescer em meio às tensões familiares.
“Por Trás das Flores” explora de maneira delicada as tensões entre o passado e o presente, entre a memória e a realidade. Com uma abordagem psicanalítica, o espetáculo conduz o público por uma viagem introspectiva através das vidas de mãe e filha, revelando como o passado molda o presente e como as raízes ancestrais, mesmo à distância, continuam a influenciar nossas escolhas e destinos.
Com uma encenação intimista e interpretações marcantes de Helena Ranaldi e Martha Meola, “Por Trás das Flores” promete emocionar o público ao revelar as nuances complexas do relacionamento entre mãe e filha, e ao mostrar que, mesmo em meio às tensões, sempre há espaço para a renovação e o crescimento.