“A Filha do Pescador” explora tensões sociais inerentes à transexualidade

Por Reinaldo Glioche

Cena de A Filha do Pescador
Foto: Divulgação

Filmes sobre transição de gênero e consequente choque familiar não são uma novidade no circuito independente e é muito difícil desviar dos clichês, o que afigura esse tipo de narrativa mais convidativa são justamente as idiossincrasias de cada história. No caso de “A Filha do Pescador”, uma coprodução entre Colômbia, Brasil, Porto Rico e República Dominicana, o embate entre um pai bruto, Samuel, que vive em uma ilha remota de pescadores, e a filha, Priscila, que a última vez que o pai vira era Samuelzinho.

Esse retorno já se daria com traumas e instabilidades, mas quando Priscila surge, provavelmente foragida de um crime que cometeu na cidade grande, com um passado de drogas e prostituição, tudo fica mais à flor da pele. Priscila também está com dívidas e quer o socorro do pai, que a destrata e a rejeita com crueza. É desse conflito, que se dá em gestos, ressentimentos e na aspereza das palavras, que o longa do colombiano Edgar de Luque Jácome se ocupa.

O sumiço dos peixes afere um ambiente de mais ansiedade na ilha já conflagrada pela presença de uma mulher que antes era homem. É uma sutileza da realização para treinar o olhar da audiência. A presença de Priscila tumultua a ordem natural da ilha e outro espelho utilizado por Jácome são as tensões eróticas. Não se trata de sexualizar corpos ou fetichizar a figura da mulher trans, mas de recepcionar a curiosidade mútua, o desejo latente por uma construção imagética de liberdade e possibilidade.

Não há grandes arroubos no filme, que é enxuto (cerca de 80 minutos) e os desenlaces são previsíveis, mas o zelo estético da realização enrobustece o drama, tornando “A Filha do Pescador“, com suas reminiscências e divagações, uma experiência luminosa.

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