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Aos 80, Zezé Motta vislumbra novos horizontes e revê legado

Redação Culturize-se

Fotos: Divulgação/Gustavo Arrais

Zezé Motta, uma das figuras mais icônicas da cultura nacional, celebra 80 anos de vida. Com uma carreira que abrange cinema, televisão, teatro e música, Zezé é mais do que uma talentosa atriz e cantora; ela é uma voz potente na luta contra o racismo e uma defensora incansável dos direitos humanos.

Nascida Maria José Motta de Oliveira em 27 de junho de 1944, em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, Zezé Motta mudou-se para a capital carioca ainda jovem. Ela começou sua carreira artística no final dos anos 1960, frequentando o Teatro Experimental do Negro, fundado por Abdias do Nascimento. Esse período inicial foi fundamental para moldar sua consciência social e política.

Zezé Motta ganhou destaque no cinema brasileiro com sua atuação no filme “Xica da Silva” (1976), dirigido por Cacá Diegues. Interpretando a escrava que se tornou uma figura poderosa no Brasil colonial, Zezé encantou o público e a crítica com sua performance vibrante e carismática. Este papel icônico consolidou sua carreira e a tornou uma referência na representação de personagens negras no cinema nacional. Outros filmes notáveis em sua carreira incluem “Quilombo” (1984), “Tudo Bem” (1978) e “A Força do Xangô” (1981). Sua filmografia extensa reflete a versatilidade e profundidade de sua atuação, abrangendo diferentes gêneros e estilos.

Na televisão, Zezé Motta também deixou uma marca indelével. Ela participou de inúmeras novelas e séries, incluindo “Corpo a Corpo” (1984), onde interpretou a memorável personagem Maria de Fátima, e “A Próxima Vítima” (1995). Recentemente, atuou em séries como “Aruanas” (2019) e “Se Eu Fechar os Olhos Agora” (2018). Além de sua atuação no cinema e na TV, Zezé Motta tem uma rica trajetória no teatro e na música. No teatro, participou de diversas produções importantes, incluindo peças como “Gota D’Água” e “Orfeu da Conceição”. Como cantora, lançou vários álbuns, destacando-se pela interpretação de músicas de compositores como Luiz Melodia, Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Zezé Motta é uma das mais atuantes vozes contra o racismo no Brasil. Ela utiliza sua plataforma para denunciar a discriminação racial e lutar pelos direitos dos afro-brasileiros. Ao longo dos anos, participou de diversas campanhas e movimentos sociais, sendo uma presença constante em eventos e manifestações. Em 2018, foi homenageada no Congresso Nacional pelo Dia da Consciência Negra, reconhecimento de sua contribuição significativa para a cultura e a sociedade brasileiras. Zezé também atuou como Secretária de Igualdade Racial da cidade do Rio de Janeiro, fortalecendo sua posição como uma defensora dos direitos civis.

Sem aposentadoria à vista

Com 80 anos recém-completados, sendo 54 de carreira, a multiartista (ou “cantriz”, como gosta de se autodenominar) está envolvida em inúmeras produções para o cinema, TV e streaming. Só em 2024, ela gravou o filme “Por um Fio”, baseado no livro de Drauzio Varella com direção de David Schurmann, está em “Se Eu Tô Aqui é Por Mistério”, novo curta de Clari Ribeiro no qual vive uma bruxa futurista, e estreia na cinebiografia “Mauricio de Sousa – O Realizador de Sonhos”, de Pedro Vasconcellos. Também gravou a versão em audiobook de “Torto Arado” (Todavia), livro premiado de Itamar Vieira Junior, tem rodado o Brasil com a turnê “Coração Vagabundo – Zezé Canta Caetano”, interpretando 22 músicas do cantor, e segue forte com campanhas publicitárias para diversas marcas.

A atriz Zezé Motta aos 80 anos

“Eu tenho muitos motivos na minha trajetória para me orgulhar, mas um dos mais importantes hoje é estar em cena com essa idade”, disse recentemente em entrevista ao Gshow. “Eu não paro! É uma alegria estar na ativa”, celebra. De fato, uma alegria não só para ela, mas para o público, que pode entrar em contato com tantas facetas desta artista que é, sem dúvidas, uma das maiores figuras da cultura nacional. Sua contribuição, inclusive, foi devidamente retratada em “Tributo – Zezé Motta”, disponível no Globoplay. A produção documental, que estreou em maio, também conta com a participação de outros artistas que reconhecem o protagonismo de Zezé nas artes cênicas, na música e no movimento negro brasileiro.

“Eu fico muito feliz de saber que sirvo de referência. Esses dias, conversando com Preta Gil, ela me agradeceu por a ter inspirado. ‘Você me fez ver que eu também podia.’ Sabe, nem tudo foram flores na minha caminhada, então quando escuto uma coisa dessa, penso: a luta valeu a pena.”

É ao lado de Preta, aliás, que Zezé retorna com a quarta edição do “Especial Mulher Negra”, exibido pelo Canal E! no Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha (25/7). Com elas, Aline Wirley e Sheron Menezzes dividem o bate-papo sobre maternidade, autoestima, etarismo e sonhos. Outro grande projeto deste currículo que só multiplica feitos, com estreia prevista para setembro, é o filme “A Carta de Esperança Garcia”, do cineasta Douglas Machado. O documentário dramatizado conta a história de Esperança Garcia, mulher negra escravizada que denunciou, por meio de uma carta, as violências que ela, outras mulheres e crianças enfrentavam na fazenda dos Algodões.

Chico Buarque, 80 anos: um ícone permanente da cultura brasileira

Sem medo da idade

O comportamento revolucionário é uma marca registrada da atriz que ficou marcada com a personagem Xica da Silva. Analisando a personagem vivida por ela há 48 anos, Zezé diz que interpretá-la foi uma forma de naturalizar a presença de protagonistas negras na arte. Porém, a carga sensual em Xica lhe deixou uma herança problemática na vida amorosa.

“Em relação à sensualidade da Xica da Silva, aquilo fazia parte da minha interpretação, mas me rendeu alguns problemas, porque a personagem ficou muito introjetada no imaginário masculino. Então, quando as pessoas me viam, elas projetavam a Xica, e a Zezé ficava em segundo plano. E isso foi algo que acabou refletindo em alguns relacionamentos amorosos”, avalia a atriz.

A revolucionária Zezé enfrentou o ódio dos racistas, desta vez na televisão, ao atuar como par romântico ao lado Marcos Paulo (morto em 2012) na novela “Corpo a Corpo” (1984). Hoje, a veterana tem uma visão otimista e acha que muita coisa avançou até aqui: “Tivemos um avanço tímido. Se formos comparar com 40 anos atrás, temos um número muito maior de personagens negros e negras em posições de protagonismo na televisão, e não apenas como personagens subalternos. A ideia do negro em papéis comuns, com profissões comuns, se apaixonando, vivendo suas próprias vidas e sonhos, já está mais naturalizada no imaginário do brasileiro. Hoje em dia, as pessoas admitem o racismo, e isso já representa uma mudança muito maior em relação a um tempo atrás. Mas sem dúvida ainda temos um longo caminho a percorrer para chegar em um patamar de igualdade. Acredito que estamos na direção certa.”

Zezé Motta

Mãe de Luciana, Carla, Cíntia e Robson, Zezé vem encarando a velhice com muita naturalidade. O seu amor pela existência a faz enfrentar o processo do passar dos anos como algo natural. Sua grande angústia, no entanto, é a perda dos amigos nesse caminhar: “E por mais que eu seja uma mulher atualizada, em sintonia com todas as novidades tecnológicas e ativa no mercado de trabalho, também sinto falta de um mundo que ficou para trás. Mas isso também faz parte da vida, e temos que estar preparados.”

Resiliência, humildade e sorte a ajudaram a construir sua personalidade nesses 80 anos de vida. “Estou fazendo uma série de coisas que não tinha feito quando era mais nova. Virei até garota propaganda depois de idosa! Eu acho que é porque estou de bem com a vida, me cuido, e estou pronta para viver muitas outras experiências, mesmo com 80 anos. E tem uma coisa, eu não fico lembrando, não penso que tenho 80 anos, vivo minha vida.”

Celebrar os 80 anos de Zezé Motta é celebrar a história de uma mulher que, com talento, coragem e paixão, deixou uma marca indelével na cultura brasileira. Seu impacto como atriz, cantora e ativista é profundo e duradouro, inspirando milhões a reconhecer e combater as injustiças raciais, ao mesmo tempo em que apreciam a riqueza e a beleza da arte. Zezé Motta é, sem dúvida, uma das grandes damas da cultura brasileira, e seu legado continuará a inspirar por muitas gerações.

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