A exposição no IMS reúne cerca de 180 fotografias, além de vídeos, álbuns e câmeras. A mostra celebra o centenário de Flieg, completado neste ano
Redação Culturize-se
Hans Gunter Flieg (1923), um dos nomes mais destacados da fotografia brasileira, deixou sua marca nas áreas da indústria, publicidade e arquitetura. Suas imagens testemunham o progresso industrial e a verticalização do país, especialmente em São Paulo, a partir dos anos 1940. Suas fotografias, habilmente elaboradas, capturaram instalações industriais, máquinas, edifícios e objetos, desafiando os limites entre a objetividade da fotografia documental e a precisão formal.

Em honra à sua obra e ao centenário deste ano, o IMS Paulista inaugura, em 22 de agosto, às 18h, a exposição “Flieg. Tudo que é sólido”. A entrada é gratuita. A mostra revisita a trajetória do fotógrafo, cujo acervo está sob a tutela do IMS desde 2006. A seleção abarca cerca de 180 imagens, dois vídeos e itens como câmeras e álbuns. A curadoria está a cargo de Sergio Burgi, coordenador de fotografia do IMS, com a colaboração de Mariana Newlands. Na abertura, o curador conduzirá uma apresentação da exposição.
A jornada de Flieg se entrelaça, em dois continentes, com a história do século XX. O fotógrafo nasceu em 1923 na cidade de Chemnitz, Alemanha, em uma família judia de classe média. Em 1939, Flieg estudou fotografia em Berlim com Grete Karplus, profissional associada ao Museu Judaico da cidade, fechado pelos nazistas. No mesmo ano, sua família imigrou para o Brasil para escapar da perseguição aos judeus. A família estabeleceu-se em São Paulo e, a partir de 1945, Flieg iniciou sua carreira como fotógrafo profissional, dedicando-se principalmente a trabalhos para empresas.
Flieg fotografou para empresas como Willys-Overland, Mercedes-Benz e Marcas Famosas S/A, pioneiras na indústria automobilística brasileira. Ele também trabalhou para agências de publicidade notáveis da época, como Standard e Thompson. Além de suas atividades comerciais, atuou como fotógrafo oficial da 1ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo, em 1951, e documentou a construção da sede do Masp na Avenida Paulista durante os anos 1960.
Por dentro da exposição
A exposição é organizada em três segmentos. O primeiro apresenta imagens de arquitetura industrial, registrando grandes projetos como a construção do ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, em 1955, e das usinas hidrelétricas de Jupiá e Ilha Solteira. A seção também traz fotos da Fábrica da Duchen, em Guarulhos, projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer, em 1954, entre outros.

A segunda parte apresenta imagens capturadas no interior de fábricas, focando nos maquinários. Apesar de terem finalidades comerciais, as fotos ressaltam os aspectos escultóricos desses equipamentos industriais, com suas linhas e formas. O curador comenta sobre esses registros: “O trabalho de Flieg foi profundamente influenciado pela modernidade europeia, combinando mestria na criação formal da imagem fotográfica com controle absoluto da iluminação, exposição e processamento do filme. Com rigor formal elevado, sua fotografia industrial frequentemente permite que estruturas, equipamentos e objetos industriais, registrados de maneira objetiva e direta, resultem, em muitos casos, em imagens com forte inclinação abstrata, ampliando e atualizando a relevância do fotógrafo na esfera da fotografia moderna e contemporânea no Brasil”.
No terceiro e último segmento, os visitantes encontrarão imagens de produtos destinadas aos campos publicitário e artístico, destinadas a ilustrar catálogos e anúncios em jornais. Entre elas estão fotos de pneus, máquinas de escrever, calculadoras, conjuntos de ferramentas e mobiliário. Também estão presentes registros dos cavaletes de vidro concebidos por Lina Bo Bardi, fotografados quando o artista documentou a abertura do Masp, assim como imagens da escultura “Unidade Tripartida”, de Max Bill, vencedora do prêmio de escultura na 1ª Bienal de São Paulo em 1951.
São imagens meticulosamente produzidas, com contrastes de luz e sombra, com o objetivo de realçar as qualidades únicas de cada objeto. Em uma entrevista concedida em 2014 ao IMS, o fotógrafo ressaltou: “A importância reside em exibir o produto da melhor maneira possível. O que você faz deve ser bem-feito”.
A exposição ficará em cartaz até janeiro de 2024 e também proporcionará reflexões sobre as transformações sociais que ocorrem atualmente, tanto no âmbito do trabalho quanto nas artes, conforme observa Burgi: “A reinterpretação do acervo de Flieg no ano em que o fotógrafo completa 100 anos, agora que estamos na terceira década do século XXI – caracterizado pela construção da sociedade do conhecimento e da informação em contraposição à sociedade industrial de meados do século passado –, permite que sua obra seja compreendida a partir de novas perspectivas”.
O curador acrescenta em relação ao tema: “A perspectiva oferecida por Flieg sobre uma sociedade industrial que buscou e criou a modernidade em São Paulo no pós-guerra, sem contudo romper com os mecanismos de reificação, alienação e poder de sua época, nos leva agora, décadas depois, a refletir sobre uma sociedade pós-industrial que também enfrenta profundas transformações e contradições, onde mais uma vez, tudo que é sólido se desvanece no ar”.