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Redenção invisibilizada aturde protagonista de “A Baleia”

Brendan Fraser lidera um elenco sublime no novo longa de Darren Aronofsky, que se apresenta divisivo e cheio de reminiscências como de hábito

Por Reinaldo Glioche

O aspecto que mais chama a atenção em “A Baleia” é a crueza com que Darren Aronofsky conta a história de Charlie (Brendan Fraser), um professor de literatura com obesidade mórbida que está à espera da morte, que a corteja e sente que ela finalmente vem em seu encontro.

Há pouco espaço para sutileza, como habitual em Aronofsky, mas as atuações inspiradas de Brendan Fraser e Hong Chau, merecidamente lembradas no Oscar, que também prestigia o excepcional trabalho de maquiagem, encontram atalhos para o minimalismo em meio ao estridente jogo de cena que o cineasta promove em “A Baleia”.

Fotos: divulgação

Sentindo a morte próxima, esse homem que é prisioneiro de si mesmo, e de suas escolhas, tenta se aproximar da filha que deixou para trás quando saiu do armário para viver um amor que lhe rendeu muitas provações. Estamos no terreno da redenção invisibilizada e inviabilizada.

Ellie, vivida com energia e assombro por Sadie Sink, é uma adolescente problemática. Do tipo que agride tudo que encontra pela frente. A reaproximação com o pai se dá por meio do desprezo a plenos pulmões, o que valeu ao filme acusações de ser gordofóbico.

Aronofsky filma na proporção 4:3 para que Charlie ocupe a maior parte do espaço de tela e os enquadramentos reforçam essa perspectiva. O diretor se preocupa em mostrar como a vida de seu protagonista está sempre por um fio, e mostra como engasgar com um pedaço de sanduíche pode ser o equivalente a um tiro no peito.

Não se trata de gordofobia, mas de corretamente estabelecer as circunstâncias desse aprisionamento que Charlie impôs para si. Reiteradamente ele recusa a possibilidade de ir ao hospital e vive dizendo que “sente muito”. É um personagem devedor. Culpa e redenção, amor e religião, temas caros à filmografia de Aronofsky, ganham aqui um relevo incidental que Fraser ajuda a dimensionar ao compor com olhares e gestos a positividade extemporânea que caracteriza o personagem e justamente lhe desmobiliza de um ambiente que lhe é tão hostil.

Darren Aronofsky e Brendan Fraser no set de “A Baleia”

“A Baleia” se satisfaz em ser um filme-tese, um veículo para a musculatura dramática de seus atores, um ensaio sobre os elementos primais da existência – repare na concepção algo filosófica de Ellie sobre religião-, um cântico sobre as expectativas de um homem moribundo. Nesse sentido, é um filme muito honesto. A manipulação não se dá por trás das cortinas. Aronofsky quer acreditar que ainda somos capazes de acreditar. De nos importarmos. É uma escolha, claro. O cineasta, tal qual o protagonista em relação a uma atitude de sua filha, fez a sua. Fé, afinal, prega Aronofsky, é uma escolha.

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