Longa-metragem indicado a nove Oscars estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (2) e suscita algumas (dolorosas) reflexões na audiência
Por Reinaldo Glioche
Imagine alguém não gostar de você ao ponto de se mutilar? A ideia de litígio permanente está no centro de “Os Banshees de Inisherin”, indicado a nove Oscars, incluindo Melhor Filme, e vencedor de três Globos de Ouro. “A história começa com uma porta sendo fechada sem um motivo aparente, e o rompimento desta relação traz sérias consequências”, observa Brendan Gleeson.
O ator dá vida a Colm, um homem com veia filosófica que gosta de pensar ter alguma inquietação artística e que, de uma hora para outra, resolve romper sua amizade com Padráic (Colin Farrell), um sujeito simplório, que não costuma pensar nas grandes questões da vida. Ele, porém, não consegue entender o movimento de afastamento de Colm e não o aceita, o que gera uma série de indesejados desdobramentos.
Os Banshees de Inisherin” é ambientado em 1923, em plena guerra civil da Irlanda; e a metáfora mais óbvia é justamente essa, mas há diapasão para tantas outras e, inclusive, ilações sobre o quanto o fim de um relacionamento tensiona os aspectos mais sombrios da humanidade. Acrescente a essa equação a compleição da banshee, que segundo a mitologia celta é uma figura feminina e fantasmagórica que preconiza a morte. No longa, temos a Sra. McCormick (Sheila Flitton), uma anciã que observa e ouve tudo o que acontece ao seu redor. “Ela antecipa o que está prestes a acontecer e planta pequenas perguntas na mente do público. Ela também é muito inteligente, de um jeito um tanto sobrenatural”, provocou a atriz em material remetido à imprensa.
O feminino, aliás, ocupa um lugar singular no longa. Com poucas mulheres em cena, além do medo emanado pela Sra. McCormick, temos a maternidade, afeto e sobriedade que gravitam a personagem de Kerry Condon, que interpreta Siobhán, irmã de Padráic e objeto do afeto de Dominic (Berry Keoghan), um rapaz com alguma necessidade especial que é abusado pelo pai.
“Siobhán sofreu muito, então há uma certa tristeza e solidão ao seu redor. Ela está presa. Pádraic a deixa um pouco louca, como todo irmão, mas ela é bastante maternal em relação a ele”, descreve Condon.
As agruras da vida
Embora seja uma comédia, é possível dizer que “Os Banshees de Inisherin” é um dos filmes mais tristes do ano. A maneira hábil como devassa as almas desses homens escravos de sentimentos tão mundanos e ainda tão abstratos é deverás mesmerizante. “O filme é divertido, mas eu também queria captar uma tristeza. Geralmente, os cineastas não tentam mandar os espectadores tristes para casa, mas isso faz parte: uma triste verdade sobre esta história, sobre a Irlanda da época e talvez sobre a vida”, salienta McDonaugh.